Tuesday, November 25, 2008

O DESTINO FATAL DO BUFÃO - Blog do Reinaldo Azevedo - 24/11/08

Hugo Chávez ganhou as eleições em Rio Branco, Porto Velho, Palmas, Vitória, Recife e Fortaleza. E perdeu em São Paulo, Porto Alegre e Rio de Janeiro. Ops! Acho que acabei confundindo Lula e o PT com Chávez e os bolivarianos... Sim, claro, os dois países e suas respectivas lideranças máximas têm muitas diferenças, mas também há algumas semelhanças. Lá como cá, onde o assistencialismo do governo é mais presente e o oficialismo é mais virulento, a oposição enfrenta mais dificuldades. Para todos os efeitos, Chávez ganhou as eleições: seu partido levou 17 dos 22 departamentos. Mas perdeu nas áreas mais populosas do país, onde a máquina chavista encontra mais resistência.

Eleições em quase-ditaduras, como é o caso da Venezuela, são processos complicados, sujeitos às interferências do demiurgo. Na semana passada, o Beiçola de Caracas ameaçou botar os tanques na rua se a oposição vencesse o pleito. Parece que não tem como cumprir a promessa. Ele foi para o confronto, e, está claro, a população pagou para ver.

Os resultados da tal “revolução bolivariana” são pífios. O país enfrenta uma inflação de 25% ao ano, e a Venezuela é hoje um dos países mais violentos da América Latina — Caracas se tornou uma das cidades mais violentas do mundo e uma espécie de meca dos seqüestros. A insegurança jurídica gerada pela “revolução bolivariana” praticamente liquidou com a economia do país, que depende visceralmente do petróleo, cujos preços estão em queda. A desaceleração da economia mundial e a recessão nos países ricos são péssimas notícias para Chávez — e, infelizmente, para o conjunto dos venezuelanos.

Não, ele não vai largar o osso facilmente. Já antevi aqui, para o bandoleiro, um fim trágico, mais ou menos, sei lá, à moda Mussolini ou Ceausescu. E a razão é simples: o descontentamento no país é crescente, como evidencia o resultado das eleições. E será chegada a hora de apear o troglodita e seus asseclas do poder. E eles tentarão resistir.

A oposição venezuelana, desta feita, decidiu fazer a coisa certa. Se Chávez sempre empregou expedientes da democracia para golpeá-la, era evidente que seus adversários deveriam usá-los para fortalecê-la. Em vez de boicotar as eleições, os que se opõem ao chavismo decidiram, desta feita, organizar-se para ganhar a disputa. E ganharam nos estados que mais vocalizam a chamada opinião pública.

Lula, que já chegou a afirmar que há democracia “até demais” na Venezuela, talvez se visse tentando a dizer: “Olhem que maravilha! Os oposicionistas ganharam e vão tomar posse, o que faz de Chávez um democrata”. Mentira! Os oposicionistas ganharam e vão tomar posse porque o povo não se deixou intimidar pelas ameaças e porque o bandoleiro não tem condições de dar um golpe. Se pudesse, daria.

Infelizmente, os venezuelanos ainda sofrerão bastante até que pendurem o tiranete, pelos pés, em praça pública. Será um espetáculo nada edificante. Mas a bufonaria do falastrão não vai se contentar com menos.


Por Reinaldo Azevedo

FALA MENDONÇA DE BARROS – EM QUEM A CRISE VAI DOER MAIS - Blog do Reinaldo Azevedo - 24/11/08




Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações no governo FHC, é hoje economista-chefe da Quest Investimentos. Dentro do governo ou fora dele — já há muitos anos —, sua capacidade de antecipar cenários, com impressionante dose de acerto, é reconhecida por admiradores e adversários. Na entrevista abaixo, concedida com exclusividade a este blog, ele diz qual é a fatia dos brasileiros que vai sentir primeiro os efeitos da crise global — que já chegou ao Brasil, incomodando bem mais do que uma simples marolinha. Com base em dados colhidos pela MB Consultores Econômicos, ele afirma que “haverá uma redução importante nos rendimentos do trabalho dos brasileiros com renda superior a 10 salários mínimos”. Pois é, leitor amigo...

Uma das características de Mendonça de Barros é pensar as implicações políticas da economia. Não havendo um agravamento da crise, ele antevê: “O presidente Lula não enfrentará um quadro de desastre que possa destruir o apoio que hoje tem dos mais de 50% dos brasileiros que ganham menos de cinco salários mínimos (...). Eles devem apenas sentir a interrupção da melhora ocorrida nos últimos anos, não uma queda expressiva nos seu nível de vida.”
O país crescerá os 4% antevistos pelo ministro Guido Mantega (Fazenda)? “Com a redução da demanda chinesa, os preços das commodities exportadas pelo Brasil voltaram ao nível de 2002, eliminando, dessa forma, os ganhos na nossa capacidade de importar. Este movimento é que obriga o Brasil a crescer novamente a taxas de 2,5 % ao ano”, afirma Mendonça de Barros.

Na conversa abaixo, ele lembra que os economistas esperavam há tempos uma drástica desaceleração da economia mundial. A crise que chegou, diz, traz características que já tinham sido antevistas, mas também surpreende em muitos aspectos. Segue a entrevista:

Há alguns anos, economistas falam do risco do “The Big One” na economia, aquela que seria realmente uma crise grave, com terríveis efeitos globais. Queria que o senhor caracterizasse a crise que se esperava então.
Há muitos anos vivemos um grande desequilíbrio macroeconômico no mundo, representado pelo excesso de consumo privado nos EUA e de poupança em parte importante do mundo, principalmente na Ásia. Mais recentemente, durante a era Bush, o governo passou a incorrer também em grandes déficits fiscais. Em outras palavras: a taxa de poupança americana ficou ainda mais negativa, o que levou os EUA a ter déficits crescentes em seu comércio com o mundo exterior, como ensina qualquer livro-texto de economia.
Como os EUA emitem a moeda internacional, que é o dólar, esse desequilíbrio se transformou em uma fonte de instabilidade cambial, com um processo continuado de desvalorização da moeda americana. Criou também uma situação de excessiva liquidez no sistema bancário mundial, provocando uma expansão desordenada do crédito em vários países do mundo, principalmente nos próprios EUA, à medida que os dólares exportados voltavam para Wall Street. Essa dinâmica atingiu um estagio gravíssimo nos últimos dois anos, com um aumento brutal da liquidez financeira.
Um dos resultados deste processo de expansão do consumo americano foi o crescimento vigoroso de um grupo de economias emergentes – liderados pela China – por meio do comércio exterior e do investimento privado no setor industrial exportador. Os recursos gerados pelo crescimento de suas exportações passaram a ser reciclados para os EUA por intermédio de aplicações financeiras, fechando o ciclo de desequilíbrios e financiando o déficit externo americano. Vale dizer: governos como o chinês e os dos países exportadores de petróleo equilibravam a balança de pagamentos americana por intermédio da compra maciça de títulos emitidos por Washington.
A correção desses desequilíbrios era uma questão de tempo e viria necessariamente por uma redução do consumo nos EUA e de um aumento da poupança privada – principalmente das famílias – da ordem de 7% a 10% do PIB. A esse movimento tectônico, os economistas passaram a chamar de “The Big One”, expressão tomada emprestada do grande terremoto que se espera na região de Los Angeles.

Mas a crise parece não ter chegado por onde se esperava, não é? O que nela surpreende e o que já estava previsto?
Os defensores da inevitabilidade do The Big One econômico acreditavam que ele seria provocado por uma recusa dos investidores internacionais em continuar a financiar os EUA e receber uma moeda – o dólar – em processo acelerado de perda de valor. Seria essa recusa a origem desse grande ajuste macro na maior economia do mundo.
Mas The Big One teve seu início de forma diferente, com o colapso do sistema bancário americano em função do estouro da bolha imobiliária e da crise de confiança que se seguiu. E o resultado desse ajuste inesperado provocou uma valorização da moeda americana em relação às principais moedas do mundo, com exceção do iene japonês, movimento contrário ao das previsões.
Mas o ponto central era que, em determinado momento, a dependência do consumidor do crédito ilimitado chegaria ao fim, o que resultaria numa redução brusca do consumo e numa situação de recessão profunda na maior economia do mundo. Essa parada brusca nos EUA teria reflexos imediatos no resto do mundo, levando a uma situação de recessão mundial. E isso está realmente acontecendo.

A crise começou no mercado imobiliário, pegou os bancos, que financiavam a farra, e chegou às empresas. Ainda há espaço para surpresas?
Até agora, vivemos os efeitos do terremoto financeiro iniciado com a realização de enormes prejuízos no sistema bancário americano e europeu e uma fuga generalizada para investimentos mais seguros, principalmente títulos públicos dos governos americano e europeus. Esse clima de pânico entre os investidores espalhados pelo mundo provocou um processo brutal de venda de títulos de crédito privado e de ações, gerando uma perda incalculável de riqueza financeira ao redor do mundo.
Agora, vivemos os efeitos de um processo generalizado e profundo de queda da atividade econômica, com redução dos lucros das empresas, do emprego e do salário. O quarto trimestre deste ano deve apresentar números assustadores de crescimento, principalmente nos EUA. O PIB americano deve cair 4% em relação ao do mesmo período de 2007. Essa etapa é mais perigosa que a primeira, pois pode levar o mundo a uma situação de depressão sem paralelo nas últimas décadas.

As medidas tomadas até agora, por exemplo, pelos países do G 20 foram inúteis?
As ações mais vigorosas dos Bancos Centrais do G 20 podem ter estancado o pânico financeiro dos últimos meses, mas entramos agora em uma nova fase da crise em função doe risco real de depressão econômica. O único instrumento de ação conhecido para essa situação é a expansão vigorosa dos gastos públicos nos moldes do pensamento keynesiano tradicional. Mas não se sabe, com certeza, como realizar este movimento depois de décadas de desmontagem dos instrumentos públicos de ação sobre a economia privada. Para mim, essa é a grande fonte de incertezas que vivemos hoje e que vai marcar o inicio do mandato do presidente Obama.

O senhor acredita que o presidente Lula, o Lírico da Marolinha, se deu conta do tamanho da crise?
Nosso presidente já mostrou que tem uma intuição muito forte para identificar riscos para seu governo. Embora a crise só tenha chegado ao Brasil em outubro, as informações já disponíveis — e certamente de conhecimento de Lula — são suficientes para que ele se arrependa da imagem da marolinha. Basta ver a intensidade das ações do governo na tentativa de preservar o crédito bancário no Brasil. Não tenho dúvida de que Lula sabe hoje que a imagem inicial da marolinha foi um grande erro de comunicação. Ele está agora fazendo um movimento de opinião pública para preparar os brasileiros menos informados para uma realidade bem mais difícil. Para ele, será fundamental preservar o Natal e deixar que os dias piores na economia apareçam apenas depois da virada do ano. Minha intuição me diz, entretanto, que o governo não acordou ainda para a verdadeira dimensão das mudanças que vão ocorrer na economia brasileira em 2009. Isso vai acontecer depois de um período mais longo, talvez apenas na Quarta–Feira de Cinzas ....

A crise pega a economia brasileira com os índices no pico. O senhor acredita que as medidas tomadas pelo governo federal, seguidas por outras de São Paulo e Minas, que tentam manter elevado o consumo, são uma boa resposta para a crise? Por quê?
São medidas para amortecer no tempo os efeitos que estão chegando ao lado real da economia. Como já disse, o Natal está próximo, e o presidente já prometeu varias vezes que o brasileiro vai ter um período de festas muito favorável. É fundamental para a sua credibilidade que as empresas deixem para o inicio de 2009 o processo de ajustes — emprego e produção — que necessariamente vão ocorrer. Nesse sentido, eu diria que as medidas são eficientes e devem manter o bom momento para o consumidor por mais algum tempo. A massa salarial deve se estabilizar com os primeiros sinais de redução do emprego muito localizado em regiões como São Paulo.

Mas, na sua opinião, o país cresce, em 2009, os 4% previstos por Guido Mantega?
As medidas adotadas não vão impedir que o próximo ano seja muito menos brilhante do que o período 2006-2008. As previsões dos analistas apontam para um crescimento do PIB, em 2009, da ordem de 2,5%, sendo, que na primeira metade do ano, o número deve ser pouco inferior a 2% ao ano. Não se prevê nenhum desastre, mas apenas uma dinâmica menos brilhante.

O crédito secou. Temos sinais claros de desaceleração, mas a crise ainda não chegou às classes C e D. Vai chegar?
Inicialmente, a crise vai ser mais sentida nas classes de renda mais alta e na região Sudesete. A MB Consultores Econômicos prevê, para 2009, uma redução importante nos rendimentos do trabalho dos brasileiros com renda superior a 10 salários mínimos. Para os que ganham até cinco mínimos, a renda do trabalho deve ser igual à de 2008, sem crescimento.
Esse cenário foi construído assumindo-se que a crise internacional não se aprofunde e que a economia americana já se mostre em recuperação no quarto trimestre do próximo ano. Nesse caso, o presidente Lula não enfrentará um quadro de desastre que possa destruir o apoio que hoje tem dos mais de 50% dos brasileiros que ganham menos de cinco salários mínimos. Os brasileiros de renda mais baixa devem apenas sentir a interrupção da melhora ocorrida nos últimos anos, não uma queda expressiva nos seu nível de vida. O efeito maior sobre esses brasileiros virá de uma menor disponibilidade de credito e, portanto, da capacidade de consumir bens industriais.
Mas é importante ressaltar que esse cenário depende de uma recuperação da economia mundial ainda em 2009. Se isto não acontecer, poderemos ter uma situação bem menos confortável para o presidente Lula na segunda metade do próximo ano.

Até quando a China resiste como uma espécie de esperança dos emergentes?
O crescimento econômico chinês para 2009 é hoje um das questões mais importantes para o mundo emergente, principalmente para países exportadores de commodities, como é o Brasil. Foi a demanda chinesa a peça chave na melhora expressiva dos preços destes produtos entre 2002 e 2007, permitindo que o Brasil aumentasse o valor de suas exportações. Esse movimento permitiu que nossas importações tivessem um crescimento intenso ao longo do período 2006-2007. Foi essa maior disponibilidade de produtos importados que permitiu que se multiplicasse por dois a taxa de crescimento do PIB sem que voltasse a inflação do passado.
Com a redução da demanda chinesa, os preços das commodities exportadas pelo Brasil voltaram ao nível de 2002, eliminando, dessa forma, os ganhos na nossa capacidade de importar. Este movimento é que obriga o Brasil a crescer novamente a taxas de 2,5 % ao ano.
As melhores previsões para o crescimento chinês em 2009 apontam para uma redução expressiva, algo na faixa dos 7% ao ano. Mas a China terá, no próximo ano, uma liberdade maior que outras economias para acelerar seu crescimento por intermédio dos gastos do governo. Poderemos ter, já nos últimos meses de 2009, uma volta a taxas mais elevadas de crescimento econômico. Se isso acontecer, poderemos ter uma melhora nos preços das commodities e uma folga maior em nosso comercio exterior.
Lula deverá, em 2009, fixar um olho no gato – a economia americana – e outro no peixe chinês.


Por Reinaldo Azevedo

Tuesday, November 18, 2008

Lula-aqui, Evo-ali, Obama-lá - Blog do Reinaldo Azevedo - 17/11/08

Vale a pena ler o artigo de Augusto de Franco na seção Tendências/Debates da Folha. Seguem trechos:
*
Em parte por concepção, em parte por esperteza, Lula resolveu contrair a obamania. Nas vésperas da eleição americana, ele declarou: "da mesma forma que o Brasil elegeu um metalúrgico, a Bolívia, um índio, a Venezuela, o Chávez, e o Paraguai, um bispo, seria um ganho extraordinário se a maior economia do mundo elegesse um negro". É ruim.
Salva-se nessa lista de admirações só o próprio Obama. Os outros são ou serão protoditadores ou ditadores, com exceção de Lula, que é apenas um líder neopopulista manipulador. É ruim também. Mas é menos pior.

A esperteza de Lula é usar a obamania para legitimar a lulomania. Ou a evomania. Ou a chavezmania. São manias de não gostar da democracia.

Isso é tão óbvio que não pode estar em discussão. Se Lula gostasse de democracia, não teria declarado tantas vezes que Chávez "peca por excesso de democracia". Para entender, é preciso ver que Lula não quer ser chefe de governo.
Nunca quis. Ele quer ser condutor de rebanhos, guia de povos. Quer palanques extraordinários, não a ordinária rotina das tarefas administrativas.

Frans de Waal já nos cansa há anos com suposições sobre uma "Chimpanzee Politics". Ele está redondamente enganado, é claro. Mas suas hipóteses vêm a calhar para a comparação seguinte: quanto mais você se parece com um chimpanzé, mais precisa de líderes extraordinários, machos alfa e outros condutores de rebanho.
(...)
A democracia não precisa de líderes extraordinários, super-homens, caudilhos carismáticos que eletrizam as multidões e arrebatam as massas em nome de um porvir radiante. A democracia, como dizia John Dewey, é o regime das pessoas comuns; sim, das ordinárias, não das extraordinárias.
(...)
Quem precisa de coisas extraordinárias, mitos fundantes (líderes ungidos, predestinados a cumprir um papel redentor), utopias fantásticas (reinos milenares de seres superiores ou regimes universais de abundância) são autocracias, não democracias.

Quase dois terços dos americanos não foram votar no mulato Obama.
Dos que foram votar, quase a metade preferiu o macho branco caucasiano McCain. Obama, com superávits de melanina em relação a McCain, não por isso vai conduzir as massas para qualquer paraíso. E nem vai governar o tempo todo lembrando a sua condição extraordinária de negro. Se fizesse isso, seria um negro de araque.

Já Evo é um índio de araque, nesse particular, igualzinho a Lula, um metalúrgico de araque. Sim, ele o foi, mas não é mais. Há muito tempo. Aliás, já passou mais tempo como profissional do palanque, sustentado "sem produzir um botão" (a expressão é dele) por dinheiro partidário e de financiadores privados, do que como metalúrgico de chão de fábrica.
(...)
A empulhação se generalizou, em parte baseada na visão equivocada de que a origem de classe ou de raça ou cor tem alguma coisa a ver com a democracia. Não tem, pelo contrário: o reforço dessas condições extrapolíticas, conquanto possa ter um efeito simbólico importante, conspira contra a política (democrática). Uma pessoa deve ser escolhida pelas suas opiniões, não por sua extração, origem, identificação antropológica.

Lula-aqui, Evo-ali e Obama-lá são movimentos regressivos. Obama não tem culpa. Ao contrário de Lula e de Evo, ele está convertido à democracia. Mas a obamania, assim como a lulomania e a evomania, aborrece a democracia.
Assinante lê íntegra aqui


Por Reinaldo Azevedo

DE SANCTIS E SEUS JUÍZOS PERTURBADOS - Blog do Reinaldo Azevedo - 16/11/08



Olhem, tenho os vídeos em que o juiz Fausto De Sanctis tece considerações sobre o que ele entende deva ser o trabalho de um juiz. Ele também expressa o seu entendimento do que deva ser a Justiça. Hesitei um pouco antes de escrever o que vai abaixo, mas sou obrigado a concluir: ele não tem de ser afastado do caso Dantas, não. Ele tem de ser afastado é da profissão. E seu destino não me interessa. Seu discurso é o de um político, não o de um juiz. Pois que faça política. Confesso que me vi tentado a lhe recomendar um antidepressivo. Mas o seu problema é ideológico mesmo, não anímico. Não há química que dê jeito. E também me surpreendi com a sua habilidade em espancar a língua portuguesa. Ah, claro: ele se define como alguém “intenso”. Acho que meu amigo Gerald Thomas não o contrataria para o seu teatro. Thomas quer atores inteligentes, não atores “intensos”.

O vídeo que vocês vêem acima, complementado por outro, dá conta de um juiz que, de modo inequívoco, acredita que a lei e a Constituição são empecilhos para a realização da efetiva democracia e da verdadeira justiça. Ora, se ele acredita nisso, o que faz como juiz?

Ontem, uns dois ou três — talvez o mesmo leitor se fazendo passar por legião — me diziam que, ó!!!, me admiravam muito, mas, depois das minhas considerações sobre De Sanctis, passaram a desconfiar de mim. “Como você não apóia um juiz como este?” É mesmo? Então vão para o diabo que os carregue. Eu apoiar De Sanctis??? Um juiz que, sob o pretexto de pegar Daniel Dantas, cita o nazista Carl Schimitt como ideal de direito e de justiça? Reitero: vão para o diabo sem mim. Ou deixem que eu vá para o diabo sozinho, como diria o poeta. Por que havemos de ir juntos? Leitores não me faltam. E eu quero qualidade. Quem acha De Sanctis um gênio ou um mártir tem de dar pinta lá no blog do anões, dos mãos-peludas e das ratazanas. Reitero: esse juiz piorou a sua reputação comigo. Com ele, além das bobagens que diz, a língua de Camões ainda sai toda esfolada. O homem não acerta uma concordância nominal. Seu domínio da inculta e bela é pior do que o do Apedeuta.

Vejam aí o vídeo acima. Ele traz o trecho em que o juiz cita o nazista e afirma que a Constituição “tem seu valor”, mas que é só “um documento”, que “não pode ser mais importante do que nós mesmos”. Ousado, ele garante: “Isso não pode ser interpretado de outra forma”. Não??? Na parte mais preocupante de sua intervenção, declara sem receio: “O juiz que não se doa, que não se doa para a análise correta dos fatos concretos, FAZ COM QUE OS FATOS SE MEÇAM PELA JUSTIÇA, E ISSO NÃO É CERTO. É A INVERSÃO DE VALORES (...)”

Entendeu, leitor? Você pode até dizer: “O que eu tenho com isso?” Bem, você está no mundo e pode ter um inimigo ou outro. Se um dia cair nas malhas da Justiça, torça para que o juiz não seja desses que acham errado que “os fatos se meçam pela Justiça”. Se ele tratar a Justiça com esse menoscabo, convenha, você estará frito. Um juiz que acha que os fatos não se medem pela Justiça emprega qual metro, qual regra, qual medida?

Eu acho que Dantas não vai dançar. Ele pode até se dar bem. O delegado Protógenes e o juiz De Sanctis, resta evidente, meteram os pés pelas mãos. Pecaram por ideologia e incompetência. Pelo visto, eles queriam menos punir as eventuais ilegalidades de Dantas do que testar a elasticidade do estado de direito.

Comentando as escutas telefônicas, obviamente abusivas, afirma De Sanctis, já no outro vídeo: “Causa espécie a muita gente, especialmente no exterior, a discussão, estéril, de que se deve ou não fazer interceptação, SEJA ELA DE QUE NATUREZA FOR, para combater o crime organizado. Em que mundo vivemos? O mundo ideal? Esse... Eu também gostaria que não precisasse disso. Eu sou o primeiro a querer... A não abrir mão, a não usar desse instrumento, ou desses instrumentos, QUE, DE CERTA FORMA, SÃO INVASIVOS À PRIVACIDADE, MAS NÃO TEM OUTRO JEITO. Esse é o caminho. Se é o caminho, vamos fazer o caminho da melhor maneira possível”.

É a fala de um monarca absolutista, não de alguém submetido à Carta. “SEJA ELA (a escuta) DE QUE NATUREZA FOR” uma pinóia, senhor juiz! A escuta é regulada por lei. Está claro que a Operação Satiagraha violou uma penca de códigos. Só mesmo alguém que tem um nazista como ídolo do direito para achar que tudo vale a pena. Pois eu tenho uma novidade para De Sanctis: NÃO VALE.

Os dois vídeos que vocês podem ver revelam a perspectiva de um “paladinista”; de alguém que pretende posar de herói; de alguém que fala (e muito mal!!!) pelos cotovelos. Se Dantas sair impune dessa ópera bufa, os únicos responsáveis são De Sanctis e Protógenes. Eles tinham a lei para punir o banqueiro. Preferiram, de modo confesso, o caminho fora da lei.

Não há meio-termo. A fala pública do juiz é nada menos do que INACEITÁVEL. E, se ele continuar com o poder que tem, saberemos que, ao julgar uma causa, ele pensará: “OS FATOS NÃO SE MEDEM PELA JUSTIÇA”.


Por Reinaldo Azevedo

QUANDO O LEITOR MELHORA O BLOGUEIRO - Blog do Reinaldo Azevedo - 16/11/08

Num post na sexta à noite à noite, observei que não há nada de errado no fato de 8 unidades da federação concentrarem 78% do PIB, até porque, nessas áreas, concentram-se 62% da população do Brasil. O mesmo acontece em qualquer país do mundo. Com isso, chamava a atenção para a leitura vesga, segundo a qual estaríamos diante da evidência da concentração de riqueza... e conversas moles afins. Hoje em dia, até a lógica é considerada uma conspiração das elites. Não tenho os dados, mas posso deduzir: imaginem se considerarmos áreas do território nacional onde a atividade econômica é impossível e, eventualmente, proibida, como Amazônia e Pantanal... Chegaremos à conclusão de que os brasileiros se concentram e produzem riquezas onde é possível... se concentrar e produzir riquezas... E isso não quer dizer, evidentemente, que não se possa produzir mais — e em melhores condições — tanto nessas áreas de alta concentração populacional como nas outras.

Evidentemente, os tontos-maCUTs vieram com suas bobagens de sempre: “Ah, então você quer dizer...” Eu nunca “quero dizer”. Eu sempre digo.

Vejam o que me envia o internauta Marcelo — e eu sempre fico muito feliz quando um leitor deste blog evidencia que tem o que ensinar ao blogueiro. Sim, este blog é um sucesso, vocês sabem. Porque tenho o bom senso — humildade nunca!!! — de aprender com quem me lê. Segue Marcelo. Volto depois:
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15 estados norte-americanos (Califórnia, Texas, New York, Florida, Illinois, Pennsylvania, Ohio, New Jersey, North Carolina, Georgia, Virgina, Michigan, Massachussets, Washington e Maryland) concentram exatos 68,1%do PIB norte-americano (fonte: Bureau of Economic Analysis). Estes estados representavam 66,0% da população em jul/07 (fonte: US Census Bureau).

Os dois maiores estados brasileiros (SP e RJ) concentram 45,5% do PIB e representam 30,0% da população. Nos EUA, os 4 maiores estados representam 34,9% do PIB e 32,5% da população.

Bem, a renda aqui é mais concentrada do que nos EUA. Verdade inegável, como vemos pelos números. A questão é saber como chegar lá. Será via bolsa-família? Proteção dos índios/quilombolas? Cotas nas universidades públicas? Ou será através da manutenção de instituições sérias durante décadas, sem mudanças espertas das regras do jogo no meio do caminho, na base da conveniência do coronel de plantão?

Reinaldo, precisamos sim nos indignar pela concentração de renda no país. Mas não pelos motivos que se adivinham por trás das manchetes que vimos hoje. A concentração de renda não é fruto da ganância dos banqueiros e empresários, localizados no eixo sul-sudeste. A renda concentra-se onde a livre iniciativa é sufocada pela burocracia. Onde o cartório dita o ritmo dos negócios. Onde os impostos são usados para azeitar a máquina estatal, ao invés de reverter em serviços essenciais. Onde a inflação é a saída fácil para o difícil problema de equilibrar o orçamento.

Um país onde a capital da burocracia estatal representa 3,8% do PIB não vai resolver nunca o seu problema de concentração de renda. O District of Columbia representa 0,7% do PIB norte-americano. Enquanto tivermos um estado maior que o país, a desconcentração de renda será uma utopia oferecida como moeda em troca de votos.

Comento
Como diria o apaixonado por pleonasmos distraídos, na graça de autoria do Weimar, parceiro de sempre, “SUBSCREVO EMBAIXO”!!! Linha a linha.


Por Reinaldo Azevedo

Tuesday, November 11, 2008

Leitores, o mundo, o Brasil, Dois Córregos, fazenda Santa Cândida, eu mesmo...- Blog do Reinaldo Azevedo - 11/11/08

Leitores escrevem (em preto). E eu respondo (em azul):

Reinaldo,
Sinceramente, admiro você, mas às vezes não consigo te reconhecer em seus próprios textos. O que está acontecendo? Você tem sido rude com leitores que lhe querem bem e em nome de quê? Dizer que as leis americanas são brandas demais, dão direitos demais e por isso não são apropriadas ao combate ao terrorismo é insano!
Os EUA já vivenciaram muitos atentados terroristas em solo americano e feitos até mesmo por cidadãos americanos, os atentados do Unabomber, atentados contra presidentes.
Nunca ocorreu a ninguém dizer que se precisaria revogar só um pouquinho a democracia para preservá-la contra esses facínoras. Tem lhe faltado nesse assunto um pouco mais de reflexão, o que eu vou atribuir à falta de tempo, escrever em tempo real não deve ser fácil.
Daqui a pouco você fala como o DeSanctis e diz que a constituição americana não é mais importante que o combate ao terrorismo. No momento em que os terroristas não puderem ter acesso às "garantias da democracia" porque alguém julga que isso pode "solapar os seus princípios" eu lhe pergunto: Quem vai julgar quem tem direito às garantias da democracia? Algum burocrata?
Isso tem um pezinho no totalitarismo, porque é no totalitarismo que o governo tem o direito de julgar a quem se aplicam as garantias individuais.
Publicar Recusar (Ranzinza) 11:00

O comentário está naquele post em que respondo à leitora que afirmou que engoli o próprio pé. E eu mostro que quem engoliu foi ela. Quer dizer que ela pode discordar de mim, mas não posso discordar dela sem que isso passe por rudeza? Onde fui rude? Não fui.
Com o devido respeito, considero uma bobagem tratar a rede do terrorismo islâmico com ações como a do tal Unabomber. Você trancafia um sujeito como esse — ou ele pode até ganhar a liberdade, porque será sempre monitorado —, e acabou. No caso da Al Qaeda, a prisão é apenas o começo.
Obama, quando começar a se tornar um homem de carne e osso, vai lhe mostrar que não será possível oferecer aos terroristas o sistema de proteção jurídica dos EUA na forma como ele está — não ao terrorismo. E a razão é simples: não foi pensado para isso. Quando menos, os facinorosos seriam devolvidos a seus países de origem, onde se preparariam para novas ações terroristas. Contra os EUA e alvos americanos. Considero uma falha de princípio, que compromete todo o argumento, não entender que o terrorismo rompe com a lógica do confronto entre inimigos, mesmo quando mortal. Ação terrorista não é ação de guerra, que, reitero, tem uma ética. *

Reinaldo,
Seu argumento vai para o brejo se vc fizer uma lógica inversa. Você pergunta: "Mas o terrorismo está em guerra contra o quê? Com que país os EUA devem negociar?". Da mesma forma, eu te perguinto: "Mas os EUA estão em guerra contra quem?". Note que não estou questionando a legitimidade da chamada "guerra contra o terror", na qual acredito. Só que a base da justificativa legal apresentada pela administração americana para justificar Guantanamo e outras ações que violam regras do Estado de Direito (e.g. violações ao direito constitucionalmente protegido à privacidade) é a existência de um estado de guerra. Ora, vc acaba de mostrar por que essa justificativa é absurda. "Guerra contra quem"?
Parece um detalhe, mas acho que é essa a distinção fundamental neste momento entre conservadores no melhor estilo Fox News e os conservadores da tradição Burkeana e Hayekiana. Eu me encontro na última categoria - tenho aversão a dar ao Estado esse poder discricionário de julgar quem é terrorista e quem não é. Ainda que com implicações completamente distintas, o princípio é análogo àquele da "classificação indicativa" no Brasil, i.e. de que não devemos deixar o Estado escolher o que podemos e o que não podemos escolher. Ou o princípio de que não é o Estado que educa as crianças, mas os pais. Se você está disposto a defender este "leap of faith" no Estado, ótimo - mas não venha criticar o uso de grampos na Polícia Federal brasileira sem autorização judicial.
Por que levanto este tema? Porque me parece a questão fundamental que o Partido Republicano deverá enfrentar para se reconstruir. Ou ele se define como um partido conservador no sentido clássico e se coloca como o defensor dos direitos individuais contra um Estado poderoso e arbitrário ou ele se junta aos elementos que colocaram em questão as regras básicas da democracia americana - secularismo, processo devido e presunção de inocência.
Um abraço,
Renato
Publicar Recusar (Anônimo) 10:12


Renato, você diz que meu argumento foi para o brejo, e eu digo que você, como muitos “conservadores” americanos, caiu vítima de uma trapaça dos “liberais” (os deles) americanos: agora eles escolhem os bons e os maus conservadores.
Os bons conservadores, claro!, na prática, convergem para as escolhas dos liberais. Já os os maus são aqueles caras da Fox News que ficam gritando feito histéricos, não é mesmo? É engraçado, não é, Renato? Nunca ninguém dirá que um porralouca liberal qualquer da TV é a face do Partido Democrata — mas um reacionário estridente da Fox é logo tomado como representante dos conservadores.
Renato, noto que Burke tem sido muito mal usado, aqui e fora daqui. A menos que o seu seja diferente do meu, até onde as questões que propõe são úteis para ler o mundo moderno, ele teria recomendado o voto em McCain. Mas os autoproclamadaos “burkianos” preferiram vencer com Obama.
Reparou que, no seu argumento, os terroristas são tratados como se fossem cidadãos americanos que tivessem transgredido a lei? E eles não são. São homens-célula de uma rede — não é assim porque eu quero. É assim porque é. Porque se demonstrou assim. A comparação com o Brasil é descabida. Os “estados policiais” no Brasil — que nada têm a ver com as medidas de segurança adotadas nos EUA — servem à guerra interna pelo poder e à política partidária. São uma tentativa de evitar a alternância no poder. Com alguma ironia, eu diria que as ações de segurança nos EUA contribuíram justamente para a alternância.
Ademais, há um óbvio exagero no antibushismo, que se tornou uma espécie de religião a unir os liberais e os ditos “burkianos”. Obama — e assim seria com qualquer outro no lugar dele — já tem em mãos o resultado de sete anos de medidas antiterroristas. Já dá para saber o que funciona e o que não funciona. Em 2001, a América não tinha a menor idéia de como reagir. Os eventos eram inéditos, numa escala jamais imaginada. Quanto à sua questão final, é preciso saber o que quer dizer “em sentido clássico” em face dos desafios do presente. Uma das características do terrorismo é justamente se aproveitar das liberalidades do sistema que eles querem solapar para... solapá-lo! Devemos lhe dar essa oportunidade ou não? Posso estar errado — espero que não —, mas acho que Obama não lhes facultará tal expediente.
*
Como assim? Pão de queijo? E por acaso em São Paulo seria viola caipira ou, em Pernambuco, buchada de bode? Cadê aquela militância contra os símbolos regionais? Ah, tá, é só quando é o RS...
Famoso cosmopolita bairrista, um tipo paulista.
(desculpa o tom do comentário, meus comentários aqui costumam ser elogiosos. ) Publicar Recusar (Anônimo) 14:18
Do mundo para a nossa província, o Brasil. Há leitor que não liga a tecla SAP — e não entende uma ironia ou uma graça a menos que o texto venha com uma tarja preta ou vermelha. Este blog é crítico permanente de “símbolos” regionalistas. Quando me referi ao lançamento em Belo Horizonte e falei do pão de queijo, pareceu-me claro que estava fazendo uma auto-ironia — vale dizer: ironizando o que eu mesmo costumo escrever.
Mas note, leitor amigo, que você não perdeu tempo: o que, no meu post, era uma piscadela simpática aos mineiros se transformou, no seu comentário, numa apreciação não muito lisonjeira dos paulistas. E eu vou insistir sempre: não sou paulista, brasileiro ou latino-americano: o máximo de coletivismo que acato é ser dois-correguense, mais especificamente da turma lá da fazenda Santa Cândida, mais particularmente ainda da família Azevedo, mais precisamente o “Reinaldo” dos Azevedos... E, às vezes, estou em guerra comigo mesmo também. O homem coletivo ou é um tolice ou é um delírio totalitário.


Por Reinaldo Azevedo

Leitora acha que engoli o próprio pé. E eu acho que quem engoliu foi ela - Blog do Reinaldo Azevedo - 11/11/08

Ana Célia Figueiredo manda um comentário cujo título é “Os fins não justificam os meios (o dia em que Reinaldo engoliu o próprio pé)”. Escreve ela:

Uma coisa é achar que a MSM mundial adora o Obama como um novo messias..."THE ONE", com razão. o que claramente é uma grande bobagem jornalística e que logo ficará menos laudatória quando o seu governo, do "THAT ONE", começar em Jan 20th,2009 ... Outra coisa é dar opiniões viciadas e sem base nas possibilidades do Estado de Direito e da Democracia (no caso, a americana).
Guantánamo é uma vergonha, sim.
Tem que ser fechada, e os prisioneiros têm direito a julgamento de acordo com o estado de direito (US LAW).Ou então são prisioneiros de guerra, e aí entra a regra da Convenção de Genebra.
Ou você vai dizer que um suposto terrorista árabe tem menos direitos do que um perigoso assassino serial americano que acaba sendo inocentado por uma tecnicalidade, com base na Lei. Estado de Direito é isso! Resultado: Vergonha!
Foi relembrado destas coisas básicas da Democracia pelo Demétrio Magnoli (pelo menos assim assinou) e agora por alguns leitores mais assíduos, como eu.
Já é a segunda vez, Reinaldo.
A primeira vez (Demétrio Magnoli) foi na crítica sobre seu livro. Que, diga-se de passagem, ficou sem resposta.
P.S. E sobre o papel subalterno do seu candidato do coração: Rudi Giuliani (...a noun,a verb and 9/11) ..nem uma palavrinha? hehehe
Publicar Recusar (Ana Célia Figueiredo) 22:54

Comento
Não engoli, não, Ana Célia. Você é que deveria procurar pelo próprio pé. Convenção de Genebra para terrorista? Qual é a hipótese? Reconhecer a Al Qaeda como um mero exército irregular ou, sei lá, uma “milícia”, mas sem base territorial determinada? Meu pé está onde sempre esteve: no solo que não permite que os terroristas usem as garantias da democracia para solapar os seus princípios. A Convenção de Genebra estabelece uma ética, um conjunto de valores, que põe inimigos, mesmo mortais, em transitividade. Na prática, significa o seguinte: “Reconhecemos essas regras; assim nos trataremos se formos feitos prisioneiros”. Mas o terrorismo está em guerra contra o quê? Com que país os EUA devem negociar? Pergunto, minha cara: e os terroristas? Dão a seus "prisioneiros" os benefícios da Convenção de Genebra? Tente saber como os talebans, por exemmplo, tratavam os russos capturados. Eram literalmente esfolados — não é metáfora — vivos. "Ah, mas os EUA não podem se igualar aos terroristas". Concordo. Mas também não podem lhes dar garantias que, na pratica, protegerão não os terroristas, mas o terrorismo. O que fazer? Você parece saber tudo. Eu não sei. E acho que nem Obama sabe.

Não há texto meu, nem antes nem agora, afirmando que Guantánamo é uma saída genial. Mas me nego a tratar os EUA com a mesma severidade — ou maior, como habitualmente se faz — com que são tratados os terroristas. Se você não sabe a diferença entre um “serial killer” e um terrorista, é inútil explicar. Se você acha que um psicopata não difere moralmente de um sujeito que passa meses planejando como jogar aviões contra edifícios, fazendo-o de modo politicamente articulado, segundo a estranha “racionalidade” do terror, não espere que eu consiga lhe provar a diferença. Você se apegaria ainda mais à suposta igualdade entre ambos. Há contrastes, minha cara, diante dos quais argumentos são inúteis. Nem sempre eles esclarecem. É uma questão de escolha moral. Numa outra dimensão, é o caso do aborto: é vida ou não é vida? Suponho que só se possa ser a favor da prática considerando-se que vida não é, certo? Ou...

Voltemos ao caso. Eu duvido que Obama vá fazer o que você gostaria que ele fizesse. Porque acredito que se exporia a um risco que talvez não valha a pena correr. Qual? O de que os eventuais libertados praticassem atos terroristas? Não exatamente. Acredito que ficariam sob vigilância enquanto estivessem no país. A possibilidade é outra. Os EUA não deixarão de combater o terrorismo islâmico no Afeganistão, no Paquistão ou no Iraque e continuarão a ser alvos potenciais do terror. Um único atentado, pequeno que fosse, transformaria isso que você chama de “estado de direito” em demonstração de leniência com o terrorismo. E o governo de Obama estaria em sérios apuros.

Quanto a não ter respondido à leitura que Demétrio fez do meu livro, era só o que faltava, não? Livros estão no mundo para se expor a críticas positivas e negativas, desde que honestas, como foi o caso. Ademais, a apreciação que ele fez foi muito favorável. Só faltava agora eu responder àquela que foi a restrição. Ademais, acho que sua (dele) contraposição era e é boa, relevante mesmo. E eu posso conviver perfeitamente com o fato de que as pessoas não concordem integralmente comigo. Aliás, quem me conhece sabe que convivo bem até com quem discorda radicalmente de mim em quase tudo — garantidos, evidentemente, aqueles que considero alguns valores fundamentais da convivência civilizada.


Por Reinaldo Azevedo

Saturday, November 08, 2008

O POLITICAMENTE CORRETO E A LÓGICA - Blog do Reinaldo Azevedo - 07/11/08

O politicamente correto destrói qualquer possibilidade de as pessoas pensarem com lógica. Contra os fatos, pretende-se que a minoria dos 13% de negros americanos (incluindo aqui os mestiços) tenham elegido o presidente da República. E qual é a conta que se faz? Ora, excluindo-se os negros e os hispânicos, Obama não teria sido eleito porque só 43% dos brancos votaram nele. Vejam o comentário que manda um leitor. Ele está de boa fé. Segue conforme ele me envia:

Tio Rei, concordo com quase todos os seus posicionamentos, uma vez que, despido de ideologias turvadoras da razão, expressa como agem de forma irracional grande parte dos petralhas; contudo, neste ponto, divirjo — estás apontando uma falácia lógica, sustentado por outra: quero dizer, se Obama foi realmente eleito pelos brancos, como que pela totalidade dos votos dos brancos ele não é maioria? Ou seja, se excluíssemos os hispânicos e os negros, e considerássemos somente os brancos, que apontas elegeram Obama, ele não seria eleito! Vênia seja feita por discordar nesse aspecto; crendo que não o tenha atingido pessoalmente, espero que seja publicado. Um abraço.
Publicar Recusar (Anônimo) 21:49

Comento
Quando afirmo que “Obama foi eleito pelos brancos” é uma resposta política a uma outra afirmação política: “Obama foi eleito pelos negros e hispânicos”. De fato, ele foi eleito pelo conjunto das pessoas que votaram nele, pouco imposta a sua pele. Qualquer dos dois grupos que fosse excluído, o eleito teria sido McCain.

Mas observem: se escolho a clivagem “cor da pele” para analisar as eleições, não posso abandoná-la no meio do caminho, certo? Então vamos ver.

E se os brancos tivessem seguido o exemplo dos negros? Imaginem uma campanha assim: “Faça como os afro-americanos; vote em alguém da sua cor”. Seria, um escândalo, eu sei. Mas a provocação ajuda a revelar a farsa da afirmação: “Obama foi eleito pelos negros e hispânicos”. Antes que chegue ao ponto, algumas considerações.

É absolutamente natural que as pessoas votem em candidatos com os quais se identifiquem mais, inclusive no que respeita à corda da pele. Isso nada tem a ver com racismo. Temos o olhar treinado, desde a tenra infância, para aprender a nos reconhecer nos nossos semelhantes imediatos. Estou tratando de uma categoria pré-política. Quando caímos na vida, conhecemos “o outro”, “os outros”, e aprendemos, na democracia ao menos, que as leis tornam essas diferenças irrelevantes no que concerne a direitos. É assim na convivência civilizada. Mas não há nada de errado com a tendência de um preto votar num preto ou um branco num branco. O mesmo vale para todas as outras afinidades, inclusive a erótica. Mas que se note: se alguém tenta “organizar” essa tendência e transformá-la num movimento organizado, aí estará fazendo política. Fazer política com cor de pele nunca resulta em coisa boa.



Os negros, mostram os dados, politizaram a sua cor: 95% votaram em Obama — e é evidente que muitos o fizeram porque consideravam o democrata mais preparado, sei disso. Pois bem: imaginemos agora essa mesma forma de politização entre os brancos: é claro que Obama não teria chance, já que formam a esmagadora maioria nos Estados Unidos.

Atenção para o que é fato e para o que é lógica: Obama só foi eleito porque os brancos não se deixaram orientar pelo mesmo critério dos negros. Se o tivessem feito, sabemos qual seria o resultado. Se vierem a fazê-lo a partir da próxima eleição, os negros jamais elegerão um novo presidente. A razão é simples: eles são a “esmagadora” minoria. Ora, Obama sempre soube disso, razão por que se colocou como o que é: um candidato americano — e não afro-americano. Se alguma decisão política houve entre os 43% de brancos que votaram em Obama, parece evidente, foi a de considerar que a cor da pele não fazia diferença.

Ora, numa eleição em que a questão racialista estava estampada na cara de um dos candidatos, o resultado foi definido por aqueles que buscaram uma identificação que transcendeu a questão da cor da pele — ou seja, os brancos.

O raciocínio politicamente correto pretende ignorar o óbvio porque acredita que o fato tiraria da minoria negra uma espécie de triunfo e de orgulho: “Nós elegemos o presidente”. Bem, digam o que disserem, não se vai conseguir mudar a aritmética. Numa votação democrática, a “conquista” de uma minoria só é possível com o assentimento da maioria.


Para quem ainda não entendeu: os votos negros em Obama compuseram a maioria, é claro. Mas a decisão de fazer a maioria, caso se use a clivagem racialista, foi dos brancos, que decidiram adotar um critério diferente daquele adotado pelo negros.

Finalmente, alguém poderia perguntar: “Mas que importância tem isso?” Ela é enorme. O candidato do “change” não fará, anotem aí, nenhuma mudança tão importante na América quanto a que já havia se operado. Obama não venceu o racismo coisa nenhuma. O “racismo” é que já não era mais o mesmo. O país já havia mudado. Mas as bestas do politicamente correto se negavam a admitir e berraram até o último minuto: “Só o racismo tira a eleição de Obama”.


Por Reinaldo Azevedo

A ENTREVISTA NO PROGRAMA DO JÔ - Blog do Reinaldo Azevedo - 06/11/08





Clicando na imagem acima, vocês podem assistir à entrevista que concedi ontem à noite a Jô Soares. Creio que falte coisa de um minuto, o encerramento mesmo. Já recebi, desde ontem, centenas de comentários a respeito, com elogios a Jô e a mim, com críticas a ambos, com apreciações sobre o entrevistado que me precedeu, Tom Zé etc. Publiquei muitos e deixei de publicar outros tantos, especialmente quando carregados de ofensas ao entrevistado e ao entrevistador — e elas vieram de petralhas e não-petralhas.

Mas houve também um tipo de abordagem meio rancorosa, ainda que não ofensiva, que preferi deixar de lado. Explico: eu estava num programa de entrevistas, voltado para um público mais amplo do que aquele só interessado em política. Ora, procuro ser verdadeiro em tudo o que faço, e não foi diferente ontem. Falei o que achei conveniente, sem qualquer restrição ou censura imposta por Jô Soares, mas tinha claro que não estava numa palestra ou numa conversa como as que tenho nos eventos ligados ao meu livro. Talvez houvesse aqueles à espera de que eu usasse a entrevista para dar início à Marcha Sobre Brasília. Devagar com o andor! Faço análise política; não sou membro de um partido. Se um dia decidir isso, assim me apresentarei.

Não tenho receio de confrontos intelectuais, ao vivo ou por escrito. Muitos sabem disso do tempo em que eu era convidado para o Roda Viva, da TV Cultura. Numa entrevista como a de ontem, a despeito de divergências — e era evidente que Jô e eu as tínhamos; uma delas, sobre as eleições americanas, ficou clara —, é preciso escolher o espaço que permita o exercício civilizado das diferenças. A meu juízo, foi o que se deu. E Jô foi extremamente gentil comigo. Concordamos em discordar. Vamos dizer que aquele é o “blog” dele, com milhões de espectadores. E fui bem tratado na sua casa. Este é o meu blog, onde ele merece tratamento idêntico. E isso não se confunde com omitir as diferenças. Ao contrário: num ambiente mediado por uma ética, as divergências podem ser expostas mais claramente. Como escreveu Ricardo Reis (Fernando Pessoa):

“Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive”

Foi o que procurei fazer num programa de entrevistas, que tinha uma inteireza e uma unidade que eu não podia ignorar, precedido que fui de Tom Zé. Quanto ao tom amistoso da conversa — que alguns censuraram, acreditem —, fazer o quê? Sou uma pessoa bem-humorada, quase sempre feliz. E isso transparece nos meus textos, nos meus livros. Não aspiro à gravidade dos santos nem dos profetas. Quem ainda não entendeu um tanto de galhofa (casada com alguma melancolia) no que escrevo não me entendeu direito. Acho que a entrevista ajudou a aproximar muita gente do livro O País dos Petralhas. E eu o fiz para que fosse lido. E ele está sendo lido. O resto fica por conta da indeterminação do presente, que é o ambiente onde realmente transita o meu pensamento.


Por Reinaldo Azevedo

Friday, November 07, 2008

UMA ANÁLISE CONSERVADORA - Blog do Reinaldo azevedo - 05/11/08

A jornalista Melanie Phillips, da The Spectator, tem um blog no site da revista britânica, bem antiga, fundada em 1828. É uma conservadora sem dúvida. Escreveu um texto muito duro sobre a eleição de Barack Obama. Melanie não tem dúvida de que, com a eleição do democrata, o mundo se tornou bem menos seguro. Não tenho sobre o mandato do democrata a mesma perspectiva pessimista que ela tem — e espero que uma analista sem dúvida aguda, inteligente, esteja errada. Ou estamos todos fritos.

Mas há pelo menos dois trechos do seu artigo com os quais concordo inteiramente. No primeiro, ela observa que a América votou, aparentemente ao menos, por mudança. Mas qual mudança? Não quer mais Bush? E, então, vem a sacada realmente importante: “Bush já deixou de ser Bush. Sua política externa está zanzando na paralisia (redimida apenas pelo gênio estratégico do general Petraeus” — ela se refere ao comandante das tropas americanas no Iraque; indaga também o que será dele agora. Ela lembra ainda que os EUA estão submetidos às exigências do Tesouro e que o Congresso, controlado pelos democratas, ajudou a criar a crise da bolha imobiliária. Em suma, o Bush que está sendo aposentado – “a” mudança – não é mais Bush, mas um pato manco.

Entende-se que Melanie considera que o verdadeiro sentido do “change” de Obama é outro. E agora vem a segunda questão importante, que é uma preocupação reiterada da colunista — e, como sabem, minha também. Primeiro vamos a ela. Depois faço algumas considerações necessárias:

Segundo Melanie, a eleição revela que a América votou para mudar porque, de fato, já está em processo de mudança. E não por conta de questões demográficas, com a diminuição da importância dos brancos e maior diversidade étnica. Ela acredita que a “mudança” é o resultado do que chama de “guerra cultural”. E não tem dúvida: a civilização ocidental está perdendo. A agenda da extrema esquerda, diz Melanie, foi incorporada pelo “mainstream”. Nas escolas, por exemplo, ensinam as crianças a odiar os valores fundamentais do seu país, e elas são “seqüestradas” pela cultura do vitimismo das minorias.

Isso é exato. É fato nos EUA, na Grã-Bretanha ou no Brasil. Ou não é verdade que a cultura média — estimulada pelo mainstream infiltrado pela esquerda — trata o terrorismo islâmico, por exemplo, como mera reação às ações do Ocidente (entenda-se: EUA)? De fato, o Bush de verdade foi o “Bush de manual” com o Irã, por exemplo?

Onde não endosso inteiramente o pensamento de Melanie? Vamos ver: não tenho a menor dúvida de que as pessoas empenhadas nessa guerra cultural — tenham ou não clareza do que estão fazendo — votaram em Obama ou são seus entusiastas. E continuam a ser elas a pautar boa parte das análises feitas no Brasil e mundo afora. O que não dou como certo, e ela sim, é que Obama vá seguir essa pauta. Por alguma estranha razão, sem conhecê-lo — nem eu e nem ninguém —, acho que ele vai decepcionar essa turma. Olhem como sou otimista!!!

Mas é, sim, inquestionável que os inimigos dos Estados Unidos e do Ocidente estão em festa. Não é questão de juízo de valor, mas de fato. Eles estão nos jornais e nas revistas dizendo o que acham.

O artigo de Melanie traz algumas outras abordagens muito interessantes. Ela acusa os conservadores americanos — e britânicos — de não atacar os adversários nas questões que realmente dizem respeito aos valores fundamentais do país, aderindo, também eles, entende-se, à agenda do “progressismo”. Sobre McCain, observa que, quando ele se lembrou de fazer isso, a vaca já tinha ido pro brejo, e o expediente cheirou a desespero de perdedor.

Vale a pena ler o artigo. Reitero: não tenho sobre as questões que ela aponta a mesma perspectiva pessimista, sempre torcendo para ela estar errada. Mas o aparato intelectual, com raras exceções, que tem explicado a vitória de Obama, a despeito do próprio, revela o quão profundo é o ódio ao Ocidente e à América em particular.


Por Reinaldo Azevedo

A FARSA RACIALISTA: OBAMA FOI ELEITO PELOS BRANCOS - Blog do Reinaldo Azevedo - 05/11/08

A nossa sorte é que jornalistas e analistas políticos não constroem casas, ou elas cairiam sobre nossas cabeças. Também não são cirurgiões, ou arrancariam as vísceras do paciente ao tentar lhes reparar algum mal. Obama, o suposto candidato de uma minoria nos EUA, foi ELEITO PELOS BRANCOS, mas a clivagem que se faz para analisar o resultado é a racial. É UM MOVIMENTO DE ESTUPIDEZ COLETIVA. É o triunfo do politicamente correto sobre a razão. Os números são inquestionáveis. E, ademais, se é para falar em racismo, então racistas foram os negros e os hispânicos, que teriam VOTADO CONTRA UM BRANCO.

OCORRE QUE A MAIORIA VOTOU CONTRA BUSH E NÃO NA PELE DE BARACK OBAMA.
E, dados os números, quem elegeu Barack Obama presidente FORAM OS BRANCOS. Basta fazer as contas (com os dados disponíveis e segundo o voto declarado, é bom deixar claro).

Quantas pessoas votaram?
153,1 milhões

Quantas são negros?
13% - ou 19,9 milhões
Quantos negros declararam ter votado em Obama?
95% ou 18,91 milhões

Do total de eleitores, quantos são hispânicos?
8% ou 12,25 milhões
Quantos hispânicos declararam ter votado em Obama?
66% ou 8,09 milhões

Do total de eleitores, quantos são brancos?
74% ou 113,29 milhões
Quantos brancos declararam ter votado em Obama?
43% ou 48,71 milhões

LOGO, VOTARAM EM OBAMA
- 27 milhões de negros e hispânicos
- 48,71 milhões de brancos

Assim, sendo verdadeiros os dados, fica evidente que:
- os brancos elegeram Barack Obama, não os negros ou hispânicos;
- se alguém quiser falar em racismo, então é o caso de procurá-lo entre os negros principalmente, e secundariamente entre os hispânicos;
- o famoso “racismo” entre os brancos é uma questão, hoje, que tem importância apenas para a militância das minorias, como sempre. Os brancos que votaram em Obama acharam que a cor da pele não tem importância ou, vá lá, é menos importante do que as restrições todas que têm ao governo Bush.

Vivemos a era do surrealismo analítico. É uma sorte — para ele próprio — que Obama não seja tão idiota quanto seus entusiastas. Se tivesse feito o discurso racial que fazem os analistas, é evidente que não teria sido eleito. Por isso, habilmente, driblou a questão e falou sempre em superar essa clivagem. Por isso omitiu a questão até e seu discurso da vitória, preferindo reafirmar a vitalidade da democracia americana.

E como! O sistema é realmente forte. Afinal, um candidato apresentado como representante de 13% da população — de todo modo, é mentira: “metade” de Obama pertence ao grupo de 74% dos americanos — é eleito como uma impressionante massa de votos do grupo que a militância apresenta como um rival. Ele não caiu nessa esparrela. Continuo no post seguinte.


Por Reinaldo Azevedo

Wednesday, November 05, 2008

BARACK OBAMA: O ALFA E O ÔMEGA, O PRINCÍPIO E O FIM - Blog do Reinaldo Azevedo - 05/11/08

E vi um novo céu e uma nova terra. Porque já se foram o primeiro céu e a primeira terra, e o mar já não existe. E vi a santa cidade, a nova Jerusalém, que descia do céu da parte de Deus, pronta como uma esposa preparada para o seu marido. E ouvi uma grande voz, vinda do trono, que dizia: “Eis que o tabernáculo de Deus está com os homens, pois com eles habitará, e eles serão o seu povo, e Deus mesmo estará com eles. Ele enxugará de seus olhos toda lágrima; e não haverá mais morte, nem haverá mais pranto, nem lamento, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas." E o que estava assentado sobre o trono disse: “Eis que faço novas todas as coisas." E acrescentou: "Escreve; porque estas palavras são fiéis e verdadeiras." . Disse-me ainda: "Está realizado: eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim. A quem tiver sede, de graça lhe darei a beber da fonte da água da vida. Aquele que vencer herdará estas coisas; e eu serei seu Deus, e ele será meu filho”.

Acima, muita gente já percebeu, vai um trecho do Apocalipse de São João (21,1-21,7). Já se passaram todas as tormentas e todos os tormentos, e a Nova Jerusalém surge da tragédia e da morte.

Poderia ser assim. Mas não será. A quarta-feira, que já vem rondando por aí, rasgará o céu, e tudo estará no mesmo lugar de antes. A exemplo do que escrevi aqui, de certo modo, é o pior que pode acontecer para o jovem mito Barack Obama: entrar na vida. Sua presidência, anotem as minhas profecias, hehe, será marcada pela decepcionante humanização de um deus. “Decepcionante para quem?”, perguntarão alguns. E eu lhes direi: não para mim, para os republicanos e para todos os que torciam para John McCain. Também não vai decepcionar os democratas profissionais. Já chego ao ponto.

Sarah Palin é carola, martelou o jornalismo. Ela é mesmo uma criacionista estúpida, a exemplo dos eleitores daquele meião avermelhado dos Estados Unidos, uma gente bronca, tendente a levar a Bíblia ao pé da letra... Bem, vocês conhecem a abordagem. Curiosamente, no entanto, foram os partidários de Obama, sobretudo a imprensa, que emprestaram à disputa os tons de uma guerra religiosa. De um lado, levantaram-se os bons; de outro, os maus. O governo Bush foi descrito e entendido justamente como as terríveis antevisões de João. Ficaram com McCain, para continuar no Apocalipse, “os medrosos, aos incrédulos, os abomináveis, os homicidas, os adúlteros, os feiticeiros, os idólatras e todos os mentirosos”. A eles estará reservado “o lago ardente de fogo e enxofre, que é a segunda morte."

Mas do que é feita esta Nova Cidade?

Obama vai tirar as tropas do Iraque? Quando der. Vai aumentar a presença americana no Afeganistão? Quando for possível. Tem a resposta para a crise econômica mundial? Todos sabem que não — nem ele nem ninguém. Vai conseguir conter o programa nuclear iraniano? Tem uma resposta para crise do Oriente Médio? Obviamente, não. Seus planos de combate ao terrorismo prevêem uma revolução metódica? Negativo. Sua trajetória, como político ou administrador, acenam com uma abordagem realmente inédita dos problemas que hoje assolam a América e o mundo? Qual trajetória? Obama é dono de um discurso, isto sim, que a muitos, na era Bush, parece iluminista. Especialmente porque, mestiço que é — “afro-americano” para o padrão do racialismo... negro dos EUA —, preferiu ignorar o assunto, colocando-se com um candidato, vamos dizer, “pós-racialista”. A questão foi habilmente trabalhada por seus partidários. Votarei a este ponto mais tarde. Antes, falarei um pouco da “humanização” de Obama e das decepções.

DECEPÇÃO
Eu não me alinho entre aqueles — e já escrevi isso aqui há dois dias — que acreditam que Obama é o verdadeiro conservador dos Estados Unidos, recuperando o discurso que já foi um dia dos republicanos ilustrados, que teria sido degradado pela era Bush. John McCain, ele, sim, um republicano reformista (ao menos antes de a campanha esquentar), poderia representar claramente esse papel. Mas também não vejo, reitero, no presidente eleito, um esquerdista antiamericano ou um inimigo do seu país.

É que são tais e tantas as esperanças de “mudança” depositadas em Obama, que ele, evidentemente, não poderá satisfazê-las. Uma parte imensa do seu eleitorado e a larga maioria dos seus admiradores mundo afora contam com ele para que os Estados Unidos deixem de ser os Estados Unidos. Isso não acontecerá. Se viesse a acontecer, e Obama passasse a atentar contra os interesses do país (é o que muitos esperam), o homem sucumbiria. De um jeito ou de outro.

Indica a lógica do processo, depois do “We can” de toda aquela gente que realmente crê estar vislumbrando a Nova Jerusalém, que Obama terá de mostrar a um grupo muito mais restrito — o establishment — o seu “I can”. Aquele “we” resume esperanças difusas de “progressismo”, de um país que renunciaria a boa parte do que o faz ser a América. E com o “i” ele vai ter de provar que, além de ser um deles, é o melhor de todos eles — e por isso é o presidente. Já na campanha, aproximou-se Colin Powell, um republicano ilustre, e teve o apoio de Paul Volker, uma espécie de emblema dos homens que são, vamos dizer, o esteio da América.

Amigos que admiram Obama não gostam, por razões que já explicitei aqui, quando faço uma associação entre o presidente eleito dos EUA e Lula. Sim, são em tudo diferentes — a começar da formação intelectual e da modernidade do discurso. Refiro-me, já deixei claro, ao fenômeno eleitoral, de massa e de opinião pública. É inegável que um lá e outro cá representam um feixe de esperanças de mudança que têm muitos quês de adesão irracional — o que, deixo claro, em nenhum momento, põe em questão a democracia. Quero dizer com isso que o “candidato Obama”, a exemplo do candidato Lula em 2002, fez-se figura invencível, fosse qual fosse o adversário. A resistência de McCain não deixa de ser heróica — e, como se vê, nos votos totais, bem mais forte do que indicavam as pesquisas. Mas por que ninguém conseguiria vencê-lo?

QUESTÃO RACIAL
A história se encarregará, claro, de dissecar o fenômeno Obama, também um primor de organização de campanha, que soube aproveitar todos os recursos da moderna tecnologia, inclusive para arrecadar dinheiro. Mas é evidente que a questão racial, praticamente ausente de seu discurso, a não ser por alusões indiretas — E JUSTAMENTE PARA DESCARACTERTIZAR O RACISMO —, foi uma das chaves do seu sucesso. E continuou a sê-lo até o último momento. Até o seu discurso de vitória.

Suspeitava-se de um racismo envergonhado numa América que, desde as primárias do Partido Democrata, demonstrava, sim, apreço e respeito por Barack Obama. Criou-se a tese de que só esse racismo poderia derrotá-lo. E isso o transformou num candidato intocável. Obama só perderia a eleição se fosse sabotado! Um analista falava ontem na TV — já com a vitória democrata consolidada. E fez o seguinte raciocínio: no começo da campanha, Obama teve de enfrentar as acusações de que era inexperiente, mas, na verdade, elas eram apenas uma forma de mascarar o racismo. Como assim? E então ele não é mesmo inexperiente? A um branco com a sua mesma trajetória, tal indagação seria ou não legítima? A cor da pele de Obama foi a sua armadura.

Vejam só: um candidato ganha se tem mais delegados, certo? Para tanto, precisa contar com mais votos em cada estado. Estamos diante da seguinte situação:
1 – a maioria obtida por Obama lhe foi garantida pelos não-racistas;
2 – se perdesse, seguindo a tese, teria perdido, então, para o racismo;
3 – logo, a minoria que ficou com McCain é, obviamente, racista;
4 – com zero de racismo, Obama teria 100% dos votos, superando as marcas das eleições de Saddam Hussein no Iraque e de Putin na Chechênia.
E, ainda agora, consolidada a vitória, há certo esforço para provar que, embora racistas, os americanos elegeram um negro... Faz sentido? Não faz.

Volto ao Apocalipse, agora no último capítulo:

E [o anjo das sete taças] mostrou-me o rio da água da vida, claro como cristal, que procedia do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, e de ambos os lados do rio, estava a árvore da vida, que produz doze frutos, dando seu fruto de mês em mês; e as folhas da árvore são para a cura das nações. Ali não haverá jamais maldição. Nela estará o trono de Deus e do cordeiro, e os seus servos o servirão, e verão a sua face; e nas suas frontes estará o seu nome. E ali não haverá mais noite, e não necessitarão de luz de lâmpada nem de luz do sol, porque o Senhor Deus os alumiará; e reinarão pelos séculos dos séculos. (22,1-22,5).

Não será assim. E que ninguém caia na tolice de achar que a pauta dos inimigos dos Estados Unidos ou do Ocidente, esse grande cão infiel, vai mudar por causa de Obama. Eles, aliás, torciam justamente pela vitória democrata porque o consideram “ruim” para o Grande Satã. Publiquei aqui trechos da parte mansa do Apocalipse, mas não tenho, sobre o resultado, uma perspectiva apocalíptica, escatológica. Se me perguntarem: “O que você acha que Obama fará de muito especial?” Minha resposta: “Nada!” Até corre o risco, a depender da provocação que receba, de reagir com excessiva dureza porque sabe que tem um certo déficit de credibilidade na área de segurança.

Então por que McCain? Minha resposta talvez surpreenda algumas pessoas — e, de certo modo, está posta naquele texto sobre Edward Hopper: em primeiro lugar, Obama e todo esse movimento de opinião, acho eu, podem tornar a América um país onde os fracos, unidos, fazem a força, entendem? Isso serve pra cabo de guerra, mas não para as nações. O melhor dos Estados Unidos está no fato de os americanos não darem muita bola uns aos outros. Em segundo lugar, se ele fizer um bom governo, será algo realmente surpreendente: sua experiência política é ridiculamente pequena. O fenômeno Obama tem muito, creio, de reativo. Em muitos sentidos, encarna o anti-Bush, tornado o senhor do Apocalipse. Se Obama quiser, dá até para ensaiar o discurso da “herança maldita”...

Aquele que é o Alfa e o Ômega começou a se tornar homem ontem à noite. Vamos ver como ele se sai no novo papel. Acho que os eleitores de McCain e eu vamos nos decepcionar menos do que os eleitores de Barack Obama e a imprensa americana e mundial. Afinal, ainda não é o doce fim da história que encerra o Apocalipse. É só o começo.


Por Reinaldo Azevedo

UM TEXTO DE JOÃO PEREIRA COUTINHO - Blog do Reinaldo Azevedo - 04/11/08


João Pereira Coutinho, colunista da Folha, fala em seu texto de hoje sobre O País do Petralhas.
A Sagrada Família
Já tudo foi dito e escrito sobre o último livro de Reinaldo Azevedo, "O País dos Petralhas" (Record, 337 págs.). Uma feroz e divertida denúncia da política brasileira e do "establishment" petista atualmente em cena? Sem dúvida.

Mas existe uma passagem do livro que não é para rir. É para ler, meditar, talvez chorar. Acontece a propósito de nada: Reinaldo Azevedo prepara-se para sair de férias e, em momento de trégua, partilha com os leitores do blog a memória feliz de um livro aparentemente menor, "A Morte de um Apicultor", do sueco Lars Gustafsson.

Quem leu Gustafsson? Curiosamente, eu li. E perguntei-me, durante anos, se seria a única criatura do mundo a lembrar com ternura desse livro imensamente melancólico e belo. É a história de um velho, condenado por doença mortal, que vai anotando, em vários cadernos, os pensamentos, as rotinas e até as dores físicas de uma vida a caminho do fim. "Recomeçamos. Não nos rendemos", escreve o velho, vezes sem conta. E, com essa frase, termina a sua odisséia, momentos antes de a ambulância vir buscá-lo.

Reinaldo Azevedo evoca "A Morte de um Apicultor" para dizer o que de mais profundo alguém pode dizer sobre a função de uma democracia civilizada: ela existe, precisamente, para que possamos tratar das nossas vidas banais. Para que possamos ser como o velho apicultor do livro: simplesmente interessados nas nossas rotinas, nas nossas famílias, nas nossas memórias privadas. E conclui o colunista: o que é imperdoável na política brasileira não é apenas a corrupção, a boçalidade e a ignorância dos próceres. O que é imperdoável é a existência de uma elite política moralmente miserável que impede esse espaço pessoal e intransmissível onde podemos ser "senhores das nossas lendas" e alheios ao ruído do mundo. No Brasil, tudo é ruído. E no resto do mundo?

No resto do mundo, talvez não. A tese pertence a Luc Ferry e ninguém diria que Luc Ferry e Reinaldo Azevedo dariam um bom par. Mas as aparências enganam. Em "Famílias, Amo Vocês", um breve ensaio publicado no Brasil pela Objetiva, Luc Ferry retoma a observação pessoal de Reinaldo e elabora uma questão filosófica fundamental: nos tempos que passam, seremos capazes de nos sacrificar por algo ou por alguém? Ao olharmos para o brilhante século 20 e para o longo cortejo de matanças em que a centúria foi pródiga, encontramos milhões de seres humanos que marcharam e mataram em nome de puras abstrações. A Nação. O Partido. O Progresso. A Raça. O Império. O baile terminou em chamas e, hoje, no meio das cinzas, alguns zelotes ideologicamente nostálgicos lamentam o "recolhimento individualista" das nossas sociedades "burguesas" e clamam pelo inevitável, e tantas vezes sanguinário, regresso da "imaginação ao poder".

A resposta de Luc Ferry é a oposta: devemos festejar o recuo das grandes causas; e devemos, sobretudo, celebrar as pequenas. Devemos celebrar os nossos familiares, os nossos amigos. A nossa tribo. O nosso "pequeno pelotão", como dizia Burke no século 18. São eles as causas por que vale a pena lutar. São eles que constituem o princípio e o fim das nossas "transcendências".

Nas palavras do filósofo francês, houve uma "divinização do humano" ou, se preferirem, uma "transcendência na imanência" que leva o Homem ocidental a apenas "sair de si mesmo" para participar no destino daqueles que lhe estão mais próximos. As nossas utopias são pessoais, não coletivas; e esse recuo é prova da nossa maturidade política e de uma certa decência moral.

Ao longo da história, as famílias sempre estiveram ao serviço da política e foram, por vezes, estilhaçadas por ela? É hora de virar o disco: uma sociedade política civilizada deve servir as famílias; deve permitir que estas possam cultivar as suas virtudes sem a intervenção e os constantes abusos do Estado.

E o Brasil será essa sociedade política civilizada no dia em que o ruído do mundo der lugar ao silêncio dos lares. No dia em que for possível, como escreve Reinaldo Azevedo, ter uma alma, cultivar intimidades, guardar as pequenas coisas ridículas, sem que a República conspire com suas sujidades e violências. Será esse o dia em que o famoso dilema de Camus deixará de fazer sentido: a justiça ou a minha mãe?
Obviamente, a mãe.

Porque, como diria um velho apicultor sueco, nós nunca nos rendemos perante o que nos é sagrado. Recomeçamos. *

O que eles disseram sobre o livro:
- VEJA – Por Diogo Mainardi;
- O Globo – Por Demétrio Magnoli;
- No Blog do Gerald Thomas – pelo próprio;
- Gazeta Mercantil e JB – Por Augusto Nunes;
- GloboNews - Espaço Aberto Literatura – por Edney Silvestre;
- Estadão – por Rui Nogueira;
- Folha - por Eduardo Graeff



Por Reinaldo Azevedo

A Banânia do Babolorixá e Israel - Blog do Reinaldo Azevedo - 04/11/08




Na Folha. Comento depois:
O encarregado de Negócios da Embaixada de Israel em Brasília, Raphael Singer, foi convocado ao Ministério das Relações Exteriores para prestar esclarecimentos sobre críticas à visita oficial do chanceler Celso Amorim ao Irã, publicadas no sábado na Folha. As declarações de Singer foram interpretadas como ingerência do governo de Israel na política externa brasileira.
Pelos códigos diplomáticos, convocar um chefe de missão estrangeira para prestar esclarecimento equivale à formalização de um protesto contra atos vistos como prejudiciais à relação bilateral.

Comento
Faz sentido. Há uma só democracia no Oriente Médio: Israel, onde lula nunca pôs os pés. Em compensação, já promoveu uma cúpula no Brasil de ditaduras árabes e de alguns bandoleiros latino-americanos. O Brasil, sem preconceitos, diversificou o repertório com a visita de Amorim aos “companheiros” persas do Irã. O terrorista Mohamud Ahmadinejad foi oficialmente convidado a visitar Banânia. Que importa que ele tenha na sua pauta a destruição de Israel? Isso é um problema lá deles, né?, judeu atrevido! Quem sabe o tarado de Teerã venha ao país logo depois do assassino Raúl Castro, ditador de Cuba. A pocilga moral fica completa. O Itamaraty, um dia, ainda terá de ser lavado com creolina.


Por Reinaldo Azevedo

Monday, November 03, 2008

Outroladismo, outro lado e eu - Blog do Reinaldo Azevedo - 03/11/08

Quero falar de um tipo muito freqüente de leitor: aquele que, supostamente, apela à minha compreensão e ao meu senso de proporção. E gente formada, acredito, na chamada cultura jornalística do “outroladismo”, que não é a minha. Explico e explico-me. É evidente que uma reportagem que reproduza ou faça uma acusação contra alguém, especialmente quando questões relativas à honra estão em jogo, deve ouvir o “outro lado”. O acusado, pouco importa quem ele seja ou qual a sua reputação, tem de ser ouvido sobre a questão em particular, objeto da notícia. Isso é correto e saudável. O “outro lado” está para a democracia como o “outroladismo” está para o democratismo.

E o que querem esses leitores? Canso de receber coisas assim: “Pô, Reinaldo, você poderia reconhecer que o capitalismo também faz as suas vítimas”. Ou ainda: “Você se diz contra ditadores de direita e esquerda, mas é Bush?” Bem, não publico comentários assim, por mais educadinhos que sejam, porque se trata de uma DESEDUCAÇÃO HISTÓRICA E MORAL.

Não, eu não reconheço que o “capitalismo também faz as suas vítimas” — não no mesmo texto em que critico as violências da esquerda. Porque não são coisas comparáveis; porque não pretendo que as falhas — e são muitas — do capitalismo sejam usadas por um sistema que transformou a morte em massa numa forma de realizar uma utopia supostamente humanista. Diga-se do fascismo (ou dos fascismos, com suas variantes locais) o que quiserem: mas ele jamais se pretendeu um novo humanismo. O horror fascista jamais escondeu o seu caráter discriminatório, violento, assassino. Então não me venham com essa. Não caio nesse truque.

Quanto à outra questão, dizer o quê? Pode-se ser contra ou a favor George W. Bush; pode-se achar justificada ou injustificada a guerra do Iraque; mas não me venham comparar um político que, daqui a pouco, será esquecido com um dos muitos vagabundos mundo afora que se agarram ao poder e dele só saem mortos. Não me venham dizer que um líder submetido ao severíssimo escrutínio da imprensa é comparável a tiranos e tiranetes que se sustentam graças a leis discricionárias. Eu não acato essa estupidez.

Para mim, como disse certo professor que tentou esculhambar meu livro, fazendo-me o maior de todos os elogios, “existem o certo e o errado”. Ele ainda me censura por eu não fazer o que, de fato, não faço: segundo diz, eu jamais me ponho "no lugar do outro". Claro que não! O lugar do outro é do outro; o meu é o meu. E é preciso haver uma ética reconhecida por ambos que nos permita discordar. Isso é democracia. O meu “relativismo” se esgota no reconhecimento da legitimidade do outro para ser o que ele é, desde, é claro, que ele não queira solapar as bases legais que garantem a ele e a mim o direito de ser o que somos — e isso supõe que eu jamais tento solapar as ditas-cujas.

Se tenho uma opinião e se tenho um ponto de vista, isso supõe que defendo uma hierarquia de valores. Posso aprender com as contraposições do outro — e freqüentemente aprendo —, mas não me venham igualar desigualdades. Assim, o apelo à minha tolerância, nos termos em que apresento aqui, é inútil. Eu não vou aquiescer jamais que “tudo é uma questão de ponto de vista” porque é justamente disso que se aproveita o mal para se insinuar. Sim, eu acredito que há coisas que são a expressão do mal absoluto. Condescender com ditaduras, em nome de um futuro virtuoso, é uma delas.

Aqui não passa. Esse blog tem lado. Um lado só.


Por Reinaldo Azevedo

Pervertidos éticos 2 – Sobre os bobos da corte lulista - Blog do Reinaldo Azevedo - 03/11/08

Setores do jornalismo paulistano quebraram a cara, com sua bola de cristal tornada opaca pela velharia ideológica, e enganaram seus leitores. A que me refiro? Levaram boa parte deles a acreditar, aos menos nos dois primeiros terços da campanha eleitoral, que a petista Marta Suplicy seria eleita prefeita de São Paulo no primeiro turno. Entre a piedade e a delicadeza que costumo ter com alguns adversários — que talvez alimentem a pretensão de me tomar como inimigo —, vou me abster de recuperar aqui algumas colunas que anteciparam o desastre para José Serra na eleição de 2008. Gilberto Kassab, então, era tratado como um bobalhão. Serei ainda mais generoso e me dispensarei de republicar as, digamos assim, reportagens em que se sustentava que Lula passaria como um trator nessas eleições. Façam a pesquisa vocês mesmos.

Como de hábito, basta que uns poucos não comunguem de seus valores tortos e de suas antevisões erradas para que sejam tomados, então, como inimigos. Ora, os leitores deste blog sabem, não é? NUNCA TOMEI AS ELEIÇÕES DE 2008 COMO ENSAIO GERAL PARA 2010. Eles é que o faziam — enquanto vislumbravam uma lavada do PT. Pararam de fazê-lo quando ficou claro que as urnas não confirmariam seus delírios. Apontei aqui, como todo mundo, que Serra foi um dos vitoriosos deste pleito, mas em nenhum momento o tratei, porque seria um estupidez, como uma espécie de presidente virtualmente eleito.

Negar, no entanto, que Lula tenha sido derrotado é trabalho, para lembrar Diogo, das Fadas Sininho do jornalismo, catitas em seu bater nervoso de asinhas, ansiosas para levar as bombas para explodir longe do pirata. Ah, foi. Foi porque se meteu além da conta na eleição de São Paulo, anunciou a vitória da companheira Marta, disse que ela estava sendo copiada pelos adversários, diabolizou o DEM... E deu no que deu. Lula escolheu ser derrotado até em Natal, uma cidade bem menor, teoricamente mais influenciável pela fala do demiurgo. Ele fez lá o discurso mais virulento de campanha. E sua candidata foi fragorosamente derrotada. A tal da maré vermelha nem “marola” era, para usar palavra de apedêutico gosto.

Quer dizer que Lula não influenciará o eleitor no pleito presidencial? Estou entre aqueles que acreditam que qualquer candidato do Babalorixá e com o apoio do PT, mesmo que seja Dilma Rousseff — com seu discurso que é um verdadeiro “caos de idéias claras”, em meio a anacolutos que espancam a língua portuguesa como um martelo —, chega facilmente a 30% na preferência do eleitorado. Por mais que o Brasil venha a sofrer os efeitos da crise, Lula terá um candidato competitivo à Presidência, seja ele quem for. Assim, as Fadas Sininho não precisam sair por levantando, nervosinhas, o saiote: vocês estão na parada, meninas! Não há, creio, “conspiração de direita” — essas das urnas, vocês sabem... — capaz de tirar do PT ao menos um lugar no segundo turno.

Lula não tem influência sobre o voto para prefeito — o munícipe sabe que ele não sabe do que está falando e faz apenas pregação partidária —, mas tem, sim, influência na escolha do futuro presidente. Assim, os erquerdólatras devem diminuir o grau de ansiedade, fazendo textos menos enfezados. Sim, as chances são grandes.

Ademais, os mesmos que escreveram e juraram de pés juntos que Serra tinha quebrado a cara escrevem e juram agora — com os pés um tanto separados — que ele é a ponta de lança ou o cavalo de Tróia de uma espécie de conspiração da direita. E têm tanta razão acerca disso como tinham quando glorificaram o seu desastre.

Para arrematar
As Fadas Sininho também se irritam quando as esquerdopatias do petismo são apontadas. E asseveram, brandindo sua varinha mágica, que esse é um discurso velho, superado, passadista. Não obstante, elas vendem àqueles mesmos leitores que estavam sendo enganados que a vitória de Gilberto Kassab, em São Paulo, caracteriza a volta da terrível direita paulistana. Dissessem isso como registro corriqueiro da vitória, vá lá, de uma direita democrática, poderia até ser um erro, mas sem dolo intelectual e jornalístico. Ocorre que, como consideram o termo “direita” uma ofensa, pretendem, com isso, colar uma pecha no prefeito e negar o óbvio: Kassab foi reeleito pelas AMAs, pelo Cidade Limpa, pelo asfaltamento, pelos dois hospitais, pelo fim das escolas de lata etc.

Tomara seja essa a nova cara da direita, não é mesmo? A eficiência mostrou ser um bom remédio contra o ódio — inclusive o destilado por certo jornalismo.


Por Reinaldo Azevedo

PERVERTIDOS ÉTICOS 1 - Sobre porcos fedorentos - Blog do Reinaldo Azevedo - 03/11/08

É formidável como os vigaristas invertem os fatos e a lógica. Vamos a um dos casos. Tratarei do outro no post seguinte. Resolveram invadir o blog para me cobrar:
“Publique a lista das vítimas que a direita fez”. Vocês querem todas mesmo, incluindo as do nazismo e do fascismo? Bem, seria um arquivo gigantesco, que chamarei de “X”. Mas e se eu tivesse como publicar a lista dos cadáveres que pesam nas costas da esquerda? Teria de multiplicar este “x” por pelo menos 25!!! Mas esse é um campeonato macabro. Quem gosta de fazer conta sobre montanhas de cadáveres são os comunistas. Eu não!

Não me venham com pilantragens. Algum governo ou veículo de respeito tratam (este "ou" vale por um conectivo, e o verbo fica no plural) Pinochet como homem de bem? Idem para ditadores argentinos ou brasileiros? Não! Todos são tratados pelo que são: ditadores. No caso de Pinochet e do argentinos, a pecha de “assassinos” colou de maneira indelével. No caso dos militares brasileiros, isso não se deu, a não ser nos círculos de esquerda, porque a ditadura — que não deveria ter matado ninguém, deixo claro — matou pouco na comparação com as suas congêneres. São 424 as chamadas vítimas do regime militar no Brasil, incluindo os que foram mortos em combate. Na Argentina, que tem 22% da população brasileira, os mortos foram 30 mil.

Quer dizer que os açougueiros argentinos ganham de lavada na América Latina? Não! Ninguém ganha de Fidel Castro, o maior assassino por 100 mil habitantes das Américas. Mas me digam: alguém já me viu a aplaudir Pinochet? Alguém já me viu a aplaudir os facinorosos argentinos? Alguém já me viu a aplaudir os ditadores brasileiros? Quem sempre dá vivas a Geisel é Lula, não eu. Eu quero que os ditadores ditos de direita do continente se danem. Quero que ardam no fogo do inferno.

Então por que os valentões da esquerda não fazem o mesmo com o assassino Raúl Castro, que matou muito mais do que Pinochet ou do que os militares tarados da Argentina? Por que ele será recebido aqui com pompa por Lula? Por que o Apedeuta foi lá paparicar, mais uma vez, o Coma Andante?

Eis uma das diferenças entre um vigarista e alguém que escolhe o caminho dos princípios. Quero que os ditadores se lasquem, todos eles, pouco importa a sua ideologia. Já a vagabundaiada que vem aqui me ofender não consegue se desgrudar das botinas dos facínoras de esquerda. Eu posso escrever coisas como: "Pinochet morreu tarde, e Fidel tarda". E os petralhas? Podem?


Por Reinaldo Azevedo

SEJA 100% CONVICTO - Blog do Reinaldo Azevedo - 02/11/08




Segue abaixo um texto que publiquei no dia 22 de abril de 2006 no jornal O Globo e que integra O País dos Petralhas. Na antevéspera da eleição americana, considero oportuno tê-lo aqui. Especialmente porque Lula receberá em breve o assassino Raúl Castro e já convidou o delinqüente Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irã e um dos financiadores do terrorismo islâmico, para visitar o país. Então segue o texto. Em nome de princípios. Em nome de convicções.
*
Escrevi dia desses sobre uma epígrafe que está no livro "The captive mind", de Czeslaw Milosz (Penguin Books), que recomendo vivamente. É uma espécie de ditado ou um aforismo espichado atribuído a um velho judeu da Galícia, que traduzo assim: "Quando alguém está 55% certo, isso é muito bom e não há discussão. Se alguém está 60% certo, isso é maravilhoso, é uma grande sorte, ele que agradeça a Deus. Mas o que dizer sobre estar 75% certo? Os prudentes já acham isso suspeito. Bem, e sobre estar 100% certo? Quem quer que diga que está 100% é um fanático, um facínora, o pior tipo de velhaco."

A inteligência está de tal sorte em baixa, que um leitor me mandou um e-mail dizendo que eu era o próprio velhaco. O sujeito não entendeu o texto como uma ironia. Não percebeu que o autor da fala defende é a convicção, não o contrário. A onda do momento, aqui e alhures, é aquiescer com a razão dos inimigos. A suposição boboca é esta: se a sua "verdade" fosse universal, é claro que o outro também estaria convencido. Se não está, talvez reste a ele alguma razão — quiçá toda ela.

A dúvida revela, a um só tempo, uma crença ingênua numa espécie de supra-razão, a que todos poderíamos chegar se convencidos por bons argumentos, e um relativismo extremo: "O que é verdade para mim pode não ser para o outro." E é assim que somos levados, cotidianamente, a duvidar dos mais óbvios e elementares valores da nossa civilização — a começar da democracia. Enquanto uns acreditam no iluminismo a ser descoberto pelos bárbaros, outros procuram elevar a metafísica bárbara à condição de um saber superior, algo que nosso racionalismo mesquinho não nos teria permitido vislumbrar.

Isso explica que sejam tantos os "orientalismos" a que se dedicam os ocidentais. Chegam a ir para a Índia para aprender verdades essenciais que teriam escapado a Santo Tomás, Voltaire, Montesquieu ou Locke. Os indianos, por sua vez, alheios à possibilidade de que, de reencarnação em reencarnação, uma lagartixa possa virar Schopenhauer, desenvolveram tecnologia nuclear e tendem a dominar o mercado de software. Eles não se importam em emprestar alguns mantras ao Ocidente desde que tenham acesso a tecnologia e mercados. O mesmo vale para a China e seus saberes milenares. O trabalho escravo rende mais do que a meditação. Melhor se a meditação faz render mais o trabalho escravo.

A crença do momento de um bom imbecil relativista é que os EUA, com seu unilateralismo (?), estaria empurrando o pobre Irã para o radicalismo. A teoria conspiratória que censura a deposição do facinoroso Saddam Hussein está em curso novamente: Washington só estaria interessado no petróleo dos aiatolás. Ainda que fosse, e daí? É o mínimo que espero do império. Ou deveria ele ceder às chantagens do delinqüente Mahmoud Ahmadinejad e, à moda de Lula, o Apedeuta, oferecer ao mundo, como alternativa, proálcool e biodiesel de mamona, babaçu e saliva?

Na questão específica da energia nuclear, entre a estupidez e a cara-de-pau, pergunta-se: "Se Israel pode ter a bomba nuclear, por que o Irã não pode?" Porque um já teria sido varrido do mapa sem ela (embora tenha vencido todas as guerras convencionais), e o outro quer a arma justamente para varrer o primeiro do mapa. É a diferença entre armamento de ataque e de dissuasão. Quem ignora a distinção faz a defesa objetiva do terrorismo nuclear.

É óbvio que não vou dar uma piscadela a meus adversários teóricos e reivindicar apenas 55%, 60% ou mesmo os já suspeitos 75% de certeza. Quero os 100%, bem próprios daqueles aos quais a esquerda e os politicamente corretos chamam de "velhacos" ou "facínoras". O Irã não pode desenvolver tecnologia nuclear que leve à bomba. E se insistir? Então será preciso que o Ocidente — e vamos ver como se comporta a Europa, no meio do caminho de uma guerra atômica — faça com as instalações nucleares do Irã o mesmo que Israel fez com as do Iraque em 1981. Nem que esse ataque seja só o começo. Também tenho 100% de certeza de que a alternativa, se contada desde o fim, é muito pior.


Por Reinaldo Azevedo

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