Tuesday, November 11, 2008

Leitores, o mundo, o Brasil, Dois Córregos, fazenda Santa Cândida, eu mesmo...- Blog do Reinaldo Azevedo - 11/11/08

Leitores escrevem (em preto). E eu respondo (em azul):

Reinaldo,
Sinceramente, admiro você, mas às vezes não consigo te reconhecer em seus próprios textos. O que está acontecendo? Você tem sido rude com leitores que lhe querem bem e em nome de quê? Dizer que as leis americanas são brandas demais, dão direitos demais e por isso não são apropriadas ao combate ao terrorismo é insano!
Os EUA já vivenciaram muitos atentados terroristas em solo americano e feitos até mesmo por cidadãos americanos, os atentados do Unabomber, atentados contra presidentes.
Nunca ocorreu a ninguém dizer que se precisaria revogar só um pouquinho a democracia para preservá-la contra esses facínoras. Tem lhe faltado nesse assunto um pouco mais de reflexão, o que eu vou atribuir à falta de tempo, escrever em tempo real não deve ser fácil.
Daqui a pouco você fala como o DeSanctis e diz que a constituição americana não é mais importante que o combate ao terrorismo. No momento em que os terroristas não puderem ter acesso às "garantias da democracia" porque alguém julga que isso pode "solapar os seus princípios" eu lhe pergunto: Quem vai julgar quem tem direito às garantias da democracia? Algum burocrata?
Isso tem um pezinho no totalitarismo, porque é no totalitarismo que o governo tem o direito de julgar a quem se aplicam as garantias individuais.
Publicar Recusar (Ranzinza) 11:00

O comentário está naquele post em que respondo à leitora que afirmou que engoli o próprio pé. E eu mostro que quem engoliu foi ela. Quer dizer que ela pode discordar de mim, mas não posso discordar dela sem que isso passe por rudeza? Onde fui rude? Não fui.
Com o devido respeito, considero uma bobagem tratar a rede do terrorismo islâmico com ações como a do tal Unabomber. Você trancafia um sujeito como esse — ou ele pode até ganhar a liberdade, porque será sempre monitorado —, e acabou. No caso da Al Qaeda, a prisão é apenas o começo.
Obama, quando começar a se tornar um homem de carne e osso, vai lhe mostrar que não será possível oferecer aos terroristas o sistema de proteção jurídica dos EUA na forma como ele está — não ao terrorismo. E a razão é simples: não foi pensado para isso. Quando menos, os facinorosos seriam devolvidos a seus países de origem, onde se preparariam para novas ações terroristas. Contra os EUA e alvos americanos. Considero uma falha de princípio, que compromete todo o argumento, não entender que o terrorismo rompe com a lógica do confronto entre inimigos, mesmo quando mortal. Ação terrorista não é ação de guerra, que, reitero, tem uma ética. *

Reinaldo,
Seu argumento vai para o brejo se vc fizer uma lógica inversa. Você pergunta: "Mas o terrorismo está em guerra contra o quê? Com que país os EUA devem negociar?". Da mesma forma, eu te perguinto: "Mas os EUA estão em guerra contra quem?". Note que não estou questionando a legitimidade da chamada "guerra contra o terror", na qual acredito. Só que a base da justificativa legal apresentada pela administração americana para justificar Guantanamo e outras ações que violam regras do Estado de Direito (e.g. violações ao direito constitucionalmente protegido à privacidade) é a existência de um estado de guerra. Ora, vc acaba de mostrar por que essa justificativa é absurda. "Guerra contra quem"?
Parece um detalhe, mas acho que é essa a distinção fundamental neste momento entre conservadores no melhor estilo Fox News e os conservadores da tradição Burkeana e Hayekiana. Eu me encontro na última categoria - tenho aversão a dar ao Estado esse poder discricionário de julgar quem é terrorista e quem não é. Ainda que com implicações completamente distintas, o princípio é análogo àquele da "classificação indicativa" no Brasil, i.e. de que não devemos deixar o Estado escolher o que podemos e o que não podemos escolher. Ou o princípio de que não é o Estado que educa as crianças, mas os pais. Se você está disposto a defender este "leap of faith" no Estado, ótimo - mas não venha criticar o uso de grampos na Polícia Federal brasileira sem autorização judicial.
Por que levanto este tema? Porque me parece a questão fundamental que o Partido Republicano deverá enfrentar para se reconstruir. Ou ele se define como um partido conservador no sentido clássico e se coloca como o defensor dos direitos individuais contra um Estado poderoso e arbitrário ou ele se junta aos elementos que colocaram em questão as regras básicas da democracia americana - secularismo, processo devido e presunção de inocência.
Um abraço,
Renato
Publicar Recusar (Anônimo) 10:12


Renato, você diz que meu argumento foi para o brejo, e eu digo que você, como muitos “conservadores” americanos, caiu vítima de uma trapaça dos “liberais” (os deles) americanos: agora eles escolhem os bons e os maus conservadores.
Os bons conservadores, claro!, na prática, convergem para as escolhas dos liberais. Já os os maus são aqueles caras da Fox News que ficam gritando feito histéricos, não é mesmo? É engraçado, não é, Renato? Nunca ninguém dirá que um porralouca liberal qualquer da TV é a face do Partido Democrata — mas um reacionário estridente da Fox é logo tomado como representante dos conservadores.
Renato, noto que Burke tem sido muito mal usado, aqui e fora daqui. A menos que o seu seja diferente do meu, até onde as questões que propõe são úteis para ler o mundo moderno, ele teria recomendado o voto em McCain. Mas os autoproclamadaos “burkianos” preferiram vencer com Obama.
Reparou que, no seu argumento, os terroristas são tratados como se fossem cidadãos americanos que tivessem transgredido a lei? E eles não são. São homens-célula de uma rede — não é assim porque eu quero. É assim porque é. Porque se demonstrou assim. A comparação com o Brasil é descabida. Os “estados policiais” no Brasil — que nada têm a ver com as medidas de segurança adotadas nos EUA — servem à guerra interna pelo poder e à política partidária. São uma tentativa de evitar a alternância no poder. Com alguma ironia, eu diria que as ações de segurança nos EUA contribuíram justamente para a alternância.
Ademais, há um óbvio exagero no antibushismo, que se tornou uma espécie de religião a unir os liberais e os ditos “burkianos”. Obama — e assim seria com qualquer outro no lugar dele — já tem em mãos o resultado de sete anos de medidas antiterroristas. Já dá para saber o que funciona e o que não funciona. Em 2001, a América não tinha a menor idéia de como reagir. Os eventos eram inéditos, numa escala jamais imaginada. Quanto à sua questão final, é preciso saber o que quer dizer “em sentido clássico” em face dos desafios do presente. Uma das características do terrorismo é justamente se aproveitar das liberalidades do sistema que eles querem solapar para... solapá-lo! Devemos lhe dar essa oportunidade ou não? Posso estar errado — espero que não —, mas acho que Obama não lhes facultará tal expediente.
*
Como assim? Pão de queijo? E por acaso em São Paulo seria viola caipira ou, em Pernambuco, buchada de bode? Cadê aquela militância contra os símbolos regionais? Ah, tá, é só quando é o RS...
Famoso cosmopolita bairrista, um tipo paulista.
(desculpa o tom do comentário, meus comentários aqui costumam ser elogiosos. ) Publicar Recusar (Anônimo) 14:18
Do mundo para a nossa província, o Brasil. Há leitor que não liga a tecla SAP — e não entende uma ironia ou uma graça a menos que o texto venha com uma tarja preta ou vermelha. Este blog é crítico permanente de “símbolos” regionalistas. Quando me referi ao lançamento em Belo Horizonte e falei do pão de queijo, pareceu-me claro que estava fazendo uma auto-ironia — vale dizer: ironizando o que eu mesmo costumo escrever.
Mas note, leitor amigo, que você não perdeu tempo: o que, no meu post, era uma piscadela simpática aos mineiros se transformou, no seu comentário, numa apreciação não muito lisonjeira dos paulistas. E eu vou insistir sempre: não sou paulista, brasileiro ou latino-americano: o máximo de coletivismo que acato é ser dois-correguense, mais especificamente da turma lá da fazenda Santa Cândida, mais particularmente ainda da família Azevedo, mais precisamente o “Reinaldo” dos Azevedos... E, às vezes, estou em guerra comigo mesmo também. O homem coletivo ou é um tolice ou é um delírio totalitário.


Por Reinaldo Azevedo

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