Tuesday, February 17, 2009

Sete Dias - Augusto Nunes - JB Online - 15/02/2009

Guerra em duas frentes – Além de bombardear o idioma, Lula agora ataca também a estatística

Há mais de 30 anos no comando da guerra contra o idioma, o presidente Lula animou a pajelança dos prefeitos, primeiras-damas e parentes a serviço do interiorzão brasileiro com o improviso que anunciou a abertura de uma segunda frente de combate. Sem abrandar a ofensiva planejada para consumar o extermínio do plural, a capitulação da gramática e a rendição da linguagem culta ao português de quem sabe o que é sifu na vida, Lula chamou para a briga a estatística, a matemática, a porcentagem e a arte de calcular.

Cabelos em desalinho, o rosto colorido por diferentes matizes de vermelho que denunciam almoços que matam a sede, a camisa e a calça inundadas pela catarata de suor, o Terror das Vogais e das Consoantes guardou a declaração de guerra para o trecho do discurso ocupado pelo relatório sobre o analfabetismo concluído recentemente por especialistas do Ministério da Educação. De repente, Lula interrompeu a procissão de cifras e dedicou alguns segundos de silêncio à surpresa causada por alguma descoberta.

Recuperada a voz, caprichou na cara de espanto e soltou a notícia simultaneamente boa (para o orador e seus devotos) e ruim (para o governador José Serra, o prefeito Gilberto Kassab, logo ali ao lado, e os oposicionistas em geral). "Pasmem, caiam de costas, Kassab, porque você não sabia e eu não sabia", tentou Lula disfarçar a alegria.

O primeiro tiro avisou que quem puxou o gatilho do trabuco na mão esquerda foi o Flagelo das Concordâncias Verbais. "No Estado de São Paulo", mandou bala na estatística o tresoitão disparado pela mão direita, "nós ainda temos 10% de analfabetos, o estado mais rico da Federação". Simulando tristeza, o pistoleiro ambidestro consolou os feridos com outro plural tão sincero quanto vereador em campanha: "Nós erramos em alguma coisa". Nós? "Na primeira do singular! Na primeira do singular!", teria berrado algum prefeito se não estivessem todos interessados só em saber quando vai chegar o dinheiro do PAC. Nós estamos fora dessa. Quem errou foi o improvisador.

Por não ler nem legenda de filme, Lula sabe ler porcentagens. Por não fazer contas sequer no canhoto do talão de cheques, o maior governante desde as caravelas não sabe calcular. Por não dar atenção a sugestões, lembretes e conselhos murmurados por assessores, ninguém se atreveu a avisar a tempo que é de 4,6% a taxa de analfabetismo registrada em São Paulo. Como o estado concentra 22% do total da população, o índice representa 10% do total de analfabetos espalhados pelo Brasil.

Se falasse menos e pensasse mais, se viajasse menos e estudasse mais, se tratasse com mais compaixão as letras, os números e os brasileiros que nunca se renderão à Era da Mediocridade, Lula se pouparia de maluquices, equívocos e confusões bisonhas como as berradas na terça-feira. "A imprensa parece achar que todos os prefeitos são ladrões", imaginou um trecho do que pareceu um samba-enredo composto por repentistas. "E trata cada um de vocês como se fosse marionete". Muito pior é ser tratado como cretino pelo presidente da República.

Monday, February 16, 2009

Por qué no te callas? - Ferreira Gullar - Folha de São Paulo 15/02/2009

Lula fala, fala, fala, viaja, viaja, viaja; o resto do tempo faz política

MINHA GENTE, estou a cada dia mais perplexo com a performance do nosso presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não que ele tenha mudado essencialmente; nada disso, ele se comporta assim desde o primeiro dia de governo: não desce do palanque.

Às vezes me pergunto se minha crescente perplexidade decorre dessa sua insistência que já dura sete anos ou de alguma outra coisa. Acho que são as duas: por um lado, já não aguento ouvi-lo falar pelos cotovelos, gesticular e postar-se como um ator num palco e, por outro, percebo-o cada vez mais à vontade para dizer o que lhe convenha, conforme o momento e conforme o público.

Sem nenhum compromisso com a verdade e com a postura de um chefe de Estado.

Ele não se comporta como chefe de Estado. Fala sempre em termos pessoais, ou louvando-se a si mesmo sem qualquer constrangimento ou acusando alguém, seja a imprensa, seja a oposição, sejam as classes ricas, sejam os países ricos.

Estão todos contra os pobres, menos ele que, felizmente, assumiu o governo do Brasil para salvá-los, após quatro séculos de implacável perseguição. Do Descobrimento até 2003, ninguém sabe como o Brasil conseguiu sobreviver, crescer, chegar a ser a oitava economia do mundo, sem o Lula! Só pode ter sido por milagre ou qualquer outro fator inexplicável.

A verdade é que, apesar de tudo, o país resistiu até o momento em que ele, Lula, chegou a tempo de salvá-lo. Isso ele afirma com uma veemência impagável, como se fosse a coisa mais óbvia e indiscutível do mundo.

Sem rir, o que é mais surpreendente ainda, diante do olhar espantado de favelados, trabalhadores, funcionários públicos, aposentados.

Já quando o público muda, ele também muda o discurso. Se fala para empresários, banqueiros, exportadores, a conversa é outra. Mostra-se preocupado com o crescimento da economia, com o apoio do BNDES à iniciativa privada e chega mesmo a admitir que sem os empresários o país não cresceria. E o balanço de final de ano mostra que os bancos realmente nunca ganharam tanto dinheiro como durante a gestão presidencial do fundador do Partido dos Trabalhadores, que se dizia inimigo número um deles.

Joga com um pau de dois bicos, mas dá certo. Diz uma coisa para os pobres e o contrário para os ricos, mas dá certo. Tanto que a sua popularidade cresce a cada nova pesquisa de opinião. Na última delas, o índice de aprovação de seu governo alcançou mais de 70% e a dele, presidente, mais de 80%. Ele fala, fala, fala, viaja, viaja, viaja; o resto do tempo faz política. Há uma cumplicidade esquisita: Lula finge que governa, e o povão finge que acredita.

Mas, infelizmente, os números da estatística não conseguem cegar-me. Pelo contrário, ao ver tamanha aprovação a um presidente da República, que busca deliberadamente engazopar a opinião pública, preocupo-me. Para onde estamos sendo arrastados? Até quando e até onde conseguirá Lula manipular a maioria dos brasileiros?

Essas considerações me ocorreram ao ler o discurso que ele pronunciou, no Rio de Janeiro, na favela da Mangueira, ao inaugurar uma escola. De ensino não falou, claro, já que não lê nem escreve. Anunciou a intenção de usar prédios públicos desativados como moradia de sem-teto. E aproveitou para mostrar como os ricos odeiam os pobres: disse que os ricos da avenida Nove de Julho, em São Paulo, não querem deixar que gente pobre venha morar ali, num prédio público desocupado. “Mas nós vamos colocar, porque a moradia é um direito fundamental do ser humano.” Palmas para ele!

Nessa mesma linha de discurso para favelados, defendeu as obras do PAC, afirmando que a parcela mais pobre da população é que será beneficiada, e aduziu: “Quando a gente faz isso, perde apoio de determinada classe social, porque gente rica não gosta que a gente cuide muito dos pobres”.

O discurso, como sempre, é atrapalhado mas suficientemente claro para que a mensagem seja entendida: os ricos odeiam os pobres, que só contam com Lula para protegê-los. A conclusão é óbvia: se o Lula é o pai dos pobres, quem se opõe a ele certamente os odeia e ama os ricos.

Assim como se apropriou de tudo o que antes combatera, improvisou o tal PAC, um aglomerado de projetos pré-existentes de empresas estatais, governos estaduais e municipais, que vai desde o pré-sal até a ampliação de metrôs e o trem-bala.

Mas o investimento do governo federal é de apenas 0,97% do PIB, menos do que investiu FHC em 2001. Se tudo o que está ali é viável ou não, pouco importa, desde que sirva para manter Lula e Dilma sob os holofotes.

Wednesday, February 11, 2009

Um homem sem (certas) qualidades - Reinaldo Azevedo - Revista Veja Edição 2099 - 11/02/2009

"Quando alguém me fala em ‘versão dos vencidos’, sempre temo que ele esteja em busca de uma justificativa moral para cortar o meu pescoço, mandar-me para o paredão ou jogar um foguete no meu quintal"

As análises que faço no blog sobre a reação de Israel aos milhares de foguetes disparados pelo Hamas rendem bombardeios de protesto – e também centenas de manifestações de apoio, é certo. As críticas revelam um aspecto curioso: dada a certeza dos missivistas de que o articulista jamais condescenderia com os motivos dos terroristas do Hamas, cobram-lhe, então, que reconheça ao menos as "culpas de ambos os lados". Às centenas, exigem o que chamam de "meio-termo", "equilíbrio" e "isenção" – e isso significa que o querem moralmente comprometido "com o mais fraco". Os mais sagazes ousam dar aulas de como é que se faz: "Relatar a versão de todas as partes envolvidas, e o leitor que tire as suas conclusões". É o jornalismo entendido como uma vitrine de divergências para satisfação do voyeurismo ideológico. Entre os produtos expostos, deveria estar também o elogio ao terror, já que há consumidores que o desejam...

Há os que ensaiam voos de alcance filosófico com sotaque francês: sustentam que a realidade nada mais é do que um "discurso sobre a realidade". Assim, o que o pobre articulista toma como "verdade" seria tão-somente a narrativa mais influente ou mais bem construída. Como a história, asseveram, é contada pelos vencedores, convidam-no a prestar atenção à "versão dos vencidos". Pois é... Uma das "versões dos vencidos" que ganhou o mundo com ares de escândalo foi o bombardeio de uma escola da ONU na Faixa de Gaza, o que foi confirmado no dia 6 de janeiro pelas próprias Nações Unidas. Ironizei então: "Até parece que Israel, quando não tem o que fazer, bombardeia escolas para se distrair". Fui chamado de cruel e insensível ao drama palestino.

Quase um mês depois, na terça-feira da semana passada, 3 de fevereiro, veio o desmentido oficial da ONU: não, os israelenses não bombardearam a escola. A organização deixou que a mentira prosperasse por quase um mês. Era propaganda do Hamas. Como sabem, estou preparado para a possibilidade de o vencedor estar certo e de sua narrativa ser, de fato, a melhor. Ademais, quando alguém me fala em "versão dos vencidos", sempre temo que ele esteja em busca de uma justificativa moral para cortar o meu pescoço, mandar-me para o paredão ou jogar um foguete no meu quintal, para citar três práticas a que os humanistas influentes de diferentes épocas já recorreram na sua "luta histórica por justiça"... Ademais, quem disse que o oprimido está necessariamente certo ou tem a melhor solução? Acreditem: quase sempre está errado e tem a pior.

Mohammed Saber/Corbis/Latinstock

O Hamas mostra os dentes
"Será que o Irã deixaria de financiar o terrorismo
se mantivesse relações amistosas com os Estados Unidos?"


O que incomoda tanto nos meus textos sobre Israel – e, a rigor, sobre qualquer assunto? O fato de, em matéria de princípio, o autor não ter por hábito exercitar nem mesmo a dúvida decorosa, aquela cheia de verbos no futuro do pretérito – para não ofender as certezas do interlocutor/leitor. Há um misto de ditado e aforismo atribuído a um velho judeu da Galícia que ilustra bem a situação: "Quando alguém está 55% certo, isso é muito bom, e não há discussão. Se alguém está 60% certo, isso é maravilhoso, é uma grande sorte, ele que agradeça a Deus. Mas o que dizer sobre estar 75% certo? Os prudentes já acham isso suspeito. Bem, e sobre estar 100% certo? Quem quer que diga que está 100% certo é um fanático, um facínora, o pior tipo de velhaco". Não custa observar: é uma ironia com quem não tolera que o outro possa ter mais de 60% de certeza...

Durante um bom tempo, a convicção viverá dias de desprestígio, e a afirmação que não apelar a zonas de ambiguidade e teorias da incerteza, para afetar tolerância e paixão pela especulação intelectual, será tachada de radical – e o radicalismo, claro, deve ser monopólio dos nossos inimigos... Tudo nos será permitido, exceto ter algumas velhas certezas. Você mesmo, leitor, deve ficar atento à orientação moral máxima destes tempos: "A virtude está no meio" – ainda que esse "meio", de fato, tenha lado. Fuja se alguém o ameaçar com uma moeda: "Cara ou coroa?". Ele é um sabotador da virtude. Na praia, quando o sorveteiro lhe perguntar o sabor do picolé, pense no que você pode perder ao ser obrigado a fazer uma escolha. Opte pela incerteza e responda: "Qualquer um". Diante de um sorveteiro, do aborto, dos foguetes do Hamas, da eutanásia, da comida japonesa, da pena de morte, do pagode, do Bolero de Ravel ou da ditadura cubana, prefira a dúvida que faz a fama dos sensíveis à certeza que faz a má fama dos dogmáticos. Não seja um lobo da estepe. Não provoque os outros com suas convicções. Não seja desagradável!

Os arautos dessa Era da Incerteza Moral pretendem que Barack Obama seja o seu Messias. Ele seria a comprovação da falência dos valores cultivados pelos conservadores e reacionários ocidentais. É como se o novo presidente, em vez de eleito e fruto das melhores virtudes da democracia na América, tivesse sido imposto à população por alguma força superior, demiúrgica, que tivesse assaltado as muralhas da tradição. Até parece que Obama mudou os EUA para se eleger. De fato, o país que há, em contínua mudança, é que o elegeu. Ele é fruto da tradição democrática, não do seu rompimento.

Se o líder não pode responder pelas tolices que dizem a seu respeito, certas falas suas, no entanto, justiça seja feita, dão asas à imaginação doidivanas que se regozija com a eleição de um suposto "inimigo dos EUA", que viria cumprir uma profecia: oficiar as exéquias do Império Americano e suas... certezas. Quais falas? Aquelas em que procede a uma espécie de mea-culpa na tentativa de diálogo com os promotores do terrorismo. Obama, sem dúvida, é produto de uma mentalidade errada, mas muito influente e agora no topo do mundo, segundo a qual o Ocidente, hoje liderado pelos EUA, teria inventado os "vários Orientes" e pautado suas demandas e dissensões.

Não deixa de ser um traço de arrogância bem ocidental ignorar que os países islâmicos (e cada um à sua maneira) ou a Rússia, que não quer ser e não vai ser parte da Europa, têm a sua própria agenda. Ou será que o Irã deixaria de financiar o terrorismo do Hamas e do Hezbollah ou de tentar levar adiante seu programa nuclear se mantivesse relações amistosas com os EUA? Convenham: bastaria que fizesse isso, e as relações com os EUA seriam... amistosas! Obama, nesse particular, é só a expressão de uma tolerância equivocada e paternalista com o sectarismo: supõe que ele se defina por uma carência de razão, compreensão e diálogo, mais ou menos como se fosse a infância do pensamento. Vamos ver a que preço vai perceber que está errado. Os iranianos acabam de responder com um foguete às mãos estendidas dos EUA. É uma pena! A gente se apega aos aiatolás, e eles aprontam uma dessas...

Importa-me menos, no entanto, o que os "orientes" estão fazendo com as convicções deles do que o que o Ocidente faz com as suas. Ressurgem por aqui os teóricos do terrorismo e da violência como método. E começam a ser admitidos na academia, na imprensa e na sala de estar. Um deles é figura frequente no debate: Slavoj Zizek, sociólogo e filósofo esloveno, autor de vários livros traduzidos no Brasil e uma das referências mundiais da extrema esquerda. Ao resenhar um livro seu para O Estado de S. Paulo, Vladimir Safatle, professor de filosofia da Universidade de São Paulo, descobriu "a invenção do terror que emancipa", falou de uma "ação revolucionária" que não cabe nos "quadros normativos do humanismo" e defendeu a construção de "estruturas institucionais universalizantes capazes de dar conta de exigências de reconhecimento de sujeitos não-substanciais que tendem a se manifestar como pura potência disruptiva e negativa". Ufa!!! Embora pareça que ele trata de gases abdominais, está falando dos terroristas, que deveriam, então, ser abrigados por "estruturas institucionais universalizantes".

E, assim, voltamos ao ponto de partida. Este escrevinhador nada tem contra a dúvida que busca a verdade. Mas está 100% convicto da superioridade moral e do valor universal da democracia. E não mudaria de ideia ainda que a maioria discordasse. A democracia é tão importante que, se preciso, tem de ser preservada até mesmo da vontade da... maioria! Mas fica para outro capítulo.

Wednesday, February 04, 2009

A MAIOR MENTIRA DA HISTÓRIA DO BRASIL - Blog do Reinaldo Azevedo - 04/02/2009

Vocês viram como a bagatela de R$ 503 bilhões que nunca existiram se transforma em mais do que o dobro num piscar dos olhos — novos — da ministra Dilma Rousseff? Faz sentido! Dobrar o que não há é tarefa fácil. Basta submeter os números a uma, se me permitem, plástica. Desta feita, para injetar gordura (ou vento), em vez de tirar.

É mesmo um troço formidável. Para todos os efeitos, o mundo entrou em crise, mas o Brasil aumentou seu programa de investimentos em estupendos R$ 646 bilhões. Só para pôr em perspectiva: o agora trilionário PAC conseguiu gastar, no ano passado, R$ 18,7 bilhões — vale dizer: 1,6% da soma megalômana. “Ah, Reinaldo, o justo é fazer a conta com o que foi efetivamente comprometido, mesmo que ainda não tenha sido pago”. Tá bom: então temos... 2,9%

É uma piada. Nunca se viu máquina de propaganda assim. Não se trata de gostar ou não gostar do governo, de ter ou não afinidade ideológica com ele, de torcer ou não para que as coisas dêem certo (ou errado). Estamos diante de uma das maiores mentiras jamais contadas no país em tempos democráticos. Ouso dizer que, no que concerne à economia e ao futuro do país, é mesmo a maior de todas mentiras, na democracia ou na ditadura.

Não deixa de ser sintomático que Dilma seja obrigada a “desmentir” os que dizem que o PAC não existe. Olhem que situação esdrúxula: como é que poderia sequer haver dúvidas, mesmo se vindas de adversários, de que algo tão colossal possa existir?

E notem um truque formidável: dos R$ 646 bilhões de dinheiro fantasma acrescidos ao PAC, nada menos de R$ 455 bilhões foram acrescentados à conta a partir de... 2010!!! Como vocês percebem, a coisa ficará a cargo do sucessor de Lula. Se for Dilma (ou qualquer outro petista), vai-se empurrando a coisa com a máscara recauchutada. Se for um oposicionista, bem... O PT vai dizer que seu plano de salvação do Brasil foi abandonado pelo adversário. Caso as coisas saiam pelo melhor, tudo terá sido obra de Lula. Ele já tem a sua herança bendita. A exemplo de Obama, Lula também é um homem que não faz história, mas pré-história.

Escrevi ontem, e o faço sempre, que o Apedeuta tem uma notável inteligência política. É claro que não concordo com aqueles que divergem da minha opinião sobre o petismo. Afinal, se concordasse, o meu pensamento coincidira com o deles, certo? É burra a crítica que me atribui subestimar o partido ou Lula. Jamais! E é compreensível aquela que me acusa de superestimá-lo, atribuindo-lhe uma articulação inexistente em qualquer outra legenda. Compreendo, mas, reitero, discordo. Qualquer força política que trate Lula e o PT como amadores que só sabem improvisar está cometendo um erro fatal.

O PAC não existe. A verba trilionária do PAC não existe. E por que a oposição se cala? Porque teme os índices de popularidade de Lula — tratei do assunto ontem, em dois textos, vejam lá. E por que boa parte da imprensa se omite? Em parte, pela mesma razão, receando se descolar, digamos, desse sentimento de adesão. Há o receio do contra-ataque. Ninguém quer parecer, como diria Marcelo Coelho, um intelectual do regime, “pessimista e sombrio”.

Aliás, caro leitor, você pode exercer, como se diz hoje em dia, a sua "cidadania". Indague aos jornalistas integrados, otimistas e iluminados, de onde vai sair o trilhão do PAC. Se eles tiverem a resposta, mandem pra cá. Será a descoberta do século.
Por Reinaldo Azevedo

NÃO, ISRAEL NÃO ATACOU A ESCOLA DA ONU. ERA UMA FARSA DO HAMAS. A ONU FOI OBRIGADA A ADMITIR A VERDADE. QUASE UM MÊS DEPOIS! CADÊ AS MANCHETES?

Blog do Reinaldo Azevedo - 04/02/2009

A notícia não está em nenhum dos jornais brasileiros ou nos grandes sites noticiosos. Lembram-se aquele ataque das Forças de Defesa de Israel a uma escola da ONU, que matou 43 pessoas? Pois é. Não foi numa escola da ONU coisa nenhuma, o que os israelenses vinham dizendo desde o dia 6 de janeiro. Só na segunda-feira, quase um mês depois, Mawell Gaylord, coordenador de ações humanitárias da ONU em Jerusalém, admite a verdade: o morteiro foi lançado numa rua PERTO da escola, mas não contra a escola.

Ora, recuperem o noticiário dos jornais e sites do Brasil e do mundo naquele dia 6. Lembro-me de ter aqui ironizado que os israelenses, maus como pica-paus, não podiam ver uma escola da ONU que iam logo jogando morteiros. Talvez para se livrar do tédio, não é? Ah, acusaram-me de insensível facinoroso. Marcelo Coelho, da Folha, sugeriu no jornal e no seu blog que tenho certa simpatia pelo assassinato em massa de crianças... Mais: como eu alertasse aqui para o óbvio — O HAMAS É A FONTE DAS NOTÍCIAS —, fui acusado de realismo estúpido. Coelho chegou a indagar algo como: “Para que jornalismo se já existem os militares?” Ou coisa assim. Chegou a minha vez de indagar: PARA QUE COELHO SE JÁ EXISTE O HAMAS?

O jornalismo dele, não sei para que serve. O meu existe, entre outras razões, para que os freqüentadores deste blog possam ler com mais acuidade o que é noticiado na imprensa.

Não se espante, leitor, se, naquele episódio, não tiverem morrido as 43 pessoas anunciadas. Todas, rigorosamente todas as ditas “atrocidades” cometidas por Israel têm origem no, como direi?, Departamento de Propaganda do Hamas: do grande número de crianças e civis mortos ao uso de bombas de fragmentação e fósforo branco para atacar pessoas. Este segundo caso, então, pode dar pano para manga. A tal substância não é considerada arma química. É empregada para iluminar alvos noturnos e criar cortina de fumaça para ação da infantaria. Israel nega que tenha feito qualquer coisa fora das leis internacionais. Como negava que tivesse jogado morteiro numa escola da ONU — e falava a verdade. De todo modo, abriu-se uma investigação.

Como se vê, o Hamas faz direitinho o seu trabalho. O ataque mentiroso à escola foi manchete do mundo inteiro. O desmentido, até agora, está apenas no Haaretz. O mundo também não se interessou em manchetar as torturas e execuções sumárias que se seguiram à retirada de Israel de Gaza.

A imprensa ocidental se deixou seqüestrar pela lógica terrorista. Esse caso da escola merece a justa designação: ESCÂNDALO. Quer dizer que os homens da ONU em Gaza demoraram um mês para fazer o que poderiam ter sido feito em cinco minutos? Escrevi aqui, certa feita, que o principal inimigo de Israel no Oriente Médio é a organização. Foi uma gritaria. Eis aí.

Bem, esperar o quê? O principal representante das Nações Unidas em Gaza é um sujeito que acredita que os próprios EUA tramaram o 11 de Setembro...

Pois é, leitores. Como diria aquele, quando já temos o terrorismo e a ONU, pra que certo jornalismo, não é mesmo?
Por Reinaldo Azevedo

Tuesday, February 03, 2009

SOBRE O PORCO FEDORENTO - UMA ENTREVISTA IMPERDÍVEL - Blog do Reinaldo Azevedo - 03/02/2009



Imperdível a entrevista que a apresentadora e jornalista de origem cubana Marlen Gonzalez fez com o ator Benicio del Toro no programa Primer Plano, do canal “41 Noticias”, de Miami. Benicio encarna, como se sabe, Che Guevara no filme Che, de Steven Soderbergh. A fita canta as glórias do Porco Fedorento. Marlen soma os dons do pensamento aos evidentes dotes da ventura. O homem começa "toro" e termina novilho. “Ah, mas ele é só um ator”. Errado! Esse rapaz andou cantando as glórias de Guevara mundo afora, com aquela frivolidade bem típica de certo tipo “engajado”.

Marlen dá início à entrevista indagando por que escolher Miami para lançar o filme, justamente uma cidade onde vivem tantos cubanos, vítimas do regime. “É uma provocação?” Toro balbucia uma negativa, um tanto apatetado. Marlen pergunta se uma fita exibindo o lado bom de Hitler não ofenderia 15 milhões de judeus e a memória de 6 milhões de vítimas. Assustado, ele diz que não crê que Guevara tenha feito campo de concentração. Pois é. Falta de informação, Toro. Vá estudar! O Porco criou o primeiro campo de trabalhos forçados da América Latina. Ela não deixa a peteca cair: “Estamos falando de assassinatos. Não é igualmente assassino quem mata um, cem, cem mil...” Toro, tadinho, tenta ainda uma saída: comparou Che a um general num campo de guerra...

Marlen lembra as opiniões favoráveis que Toro deu sobre Che e indaga se ela sabia que, à frente da prisão de La Cabaña, o dito revolucionário mandou fuzilar mais de 400 prisioneiros. E o que diz o valente? “Sabia. Muitos dos que foram fuzilados eram terroristas...” Não, atalha Marlen: “Noventa por cento eram presos de consciência. [morreram] Simplesmente por discordar do sistema nascente, por pensar diferente”. E ele: “Ah, não sabia disso”... E assim vai.

No arremate, Marlen lembra uma frase de Che: “A ação mais positiva e forte, independentemente de qualquer ideologia, é um tiro bem dado, no momento certo, em quem merece”. E presenteia o pobre Toro — àquela altura, só um bezerro gritando ‘mamãe’ — com o livro Guevara: Misionero de la Violencia, do historiador cubano e ex-preso político Pedro Corzo.

Sei lá por quê, o Blogger não está aceitando o link do YouTube. Para ver o vídeo, clique aqui. Imperdível.
Por Reinaldo Azevedo

Monday, February 02, 2009

DE HOMICIDAS E COVARDES - Blog do Reinaldo Azevedo - 02/02/2009

Não haverá protestos da ONU ou de entidades ditas defensoras de direitos humanos contra as execuções praticadas pelo Hamas na Faixa de Gaza. O relativismo moderno nos diz que facínoras têm o direito de assassinar o seu próprio povo, especialmente quando eles trazem a marca, como é o caso do Hamas, do “progressismo”. Afinal, sabemos, esses valentes comandam o que se chama “resistência” palestina. Também é de somenos que as execuções tenham sido sumárias, ao arrepio de qualquer formalidade legal — e, como não poderia deixar de ser, precedidas de tortura. Cada escola e cada hospital, tão logo Israel saiu de Gaza, foram convertidos em centros de interrogatórios. Quem não recebeu a pena capital levou tiros no joelho ou teve o braço quebrado como punição. A família era chamada para assistir às sevícias.

E não haverá uma maldita palavra a respeito. Jimmy Carter, o plantador de amendoim e mistificações, quer conversar com o Hamas.

Quando Israel ocupou Gaza, o Hamas acoitou-se entre os civis, procurando fazer o maior número possível de vítimas. Só mostrou a cara quando foi para se impor, de novo, pelo terror. Não haverá protestos. Para os progressistas, palestino matar palestino é parte da luta pela autonomia.

A ONU sabe condenar uma força militar por, involuntariamente, fazer vítimas civis numa guerra. Mas deve achar que caçar voluntariamente os adversários, eliminando-os, é parte do jogo. É o humanismo que recende a cadaverina.
Por Reinaldo Azevedo

POVO GOSTA DE GENTE HONESTA; QUEM GOSTA DE BANDIDO É JORNALISTA - Blog do Reinaldo Azevedo - 02/02/2009

Povo gosta de gente honesta; quem gosta de bandido é jornalista. A frase, claro, é adaptação de outra famosa, atribuída a Joãozinho 30: “Povo gosta de luxo; quem gosta de miséria é intelectual”. Alguns intelectuais e alguns jornalistas não hesitariam em classificá-las de “fascistas” – especialmente aqueles que não sabem o que foi o fascismo. Adiante. É um exagero certamente dizer que jornalistas gostam de bandidos – alguns apreciam; há até jornalistas bandidos. Mas quase nunca é um erro inferir que a categoria, com exceções (sempre!), não aprecia a Polícia. Em particular, odeia noticiar que ela pode ser eficiente. Toda notícia tem certo grau de distorção – é da natureza do processo, e trato disso uma outra hora. Quando o assunto é segurança pública, tal distorção pode assumir características alarmantes. Aí já não estamos lidando com uma fatalidade, mas com escolhas, quase sempre ideológicas. Foi o que se viu na imprensa paulista no sábado ao noticiar números sobre a violência em São Paulo. A Folha, vá lá, noticiou também o que tinha de ser noticiado. O caderno de Cidades do Estadão – a cada dia mais distante do resto do jornal na sua, como direi?, qualidade muito particular, – não hesitou: além de omitir dos leitores o dado principal, transformou um êxito fenomenal do estado numa derrota alarmante. Vamos aos detalhes.

Começarei pela Folha, que, na manchete e em parte do lead da reportagem, fez a coisa certa. E qual era a coisa certa? Noticiar que, atenção!, EM NOVE ANOS, OS HOMICÍDIOS NO ESTADO DE SÃO PAULO TIVERAM UMA REDUÇÃO DE 66%. Vocês leram direito. Em 2008, pelo nono ano consecutivo, o número de assassinatos caiu: 4.426 casos contra 4.877 em 2007 – 451 a menos, uma redução de 9,25%. Só esse dado já deveria servir para soltar alguns rojões. Mas quê... Só para dar uma medida: em 1999, foram 12.818 casos. Não custa lembrar que a população do estado cresceu no período. Pois bem...

A Folha teve “coragem” (vejam a que palavra recorro...) de dar a boa manchete, mas não resistiu em reproduzir na capa um dado que foi parar no título da manchete de página, a saber: “Apesar da redução, o Estado continua sendo considerado uma ‘zona epidêmica de homicídios’ - para a OMS (Organização Mundial da Saúde), existe uma epidemia quando o índice é superior a 10 homicídios para cada 100 mil habitantes. Em São Paulo, são 10,76 casos por 100 mil moradores.” A palavra “epidêmica”, sem as devidas considerações, distorce tudo. A OMS considera que um número de até 10 assassinatos por 100 mil habitantes não indica uma patologia social. Bem, São Paulo está quase lá. E por que está?

Já tratei disso aqui tantas vezes... Leiam um trecho da reportagem da Folha:
“O governo atribui a queda dos homicídios ao investimento nas polícias, ao aumento na apreensão de armas e à construção de presídios e o conseqüente crescimento da população carcerária do Estado (hoje em 145 mil presos).
Coronel reformado da PM e ex-secretário nacional de Segurança Pública da gestão FHC, José Vicente da Silva Filho diz que São Paulo ‘rompeu uma espiral’. ‘A polícia foi reabilitada, e o Estado aumentou a sua taxa de encarceramento, que é o dobro da nacional’, diz.

Notem que o jornal, digamos, não dá mole para o que seria só uma explicação oficial. Com estimados 41 milhões de habitantes, São Paulo tem quase 22% da população do Brasil, mas tem 145 mil presos – de um total estimado no país de 420 mil. Ou seja, com 22% da população, conta com 35% dos presos. Levados em conta os detidos em delegacias, cehga-se perto de 40%. OLHEM QUE COISA! Quanto mais bandido presos, menos pessoas assassinadas e menos crimes! Não é mesmo surpreendente? Muitos intelectuais e muitos jornalistas odeiam essa relação de proporcionalidade. Certa feita, um dotô uspiano usou estes números para tentar provar que São Paulo prende demais...

Pois bem. A Folha, sempre atenta a todos os lados da notícia, resolveu ouvir também o lado surrealista, que veio na fala do promotor Roberto Wider Filho. Segundo o valente, escutas mostram que homicídios comuns em algumas favelas são brutalmente reprimidos por traficantes, que não querem chamar a atenção da polícia para os seus pontos-de-venda de drogas. Ah, entendi! Que polícia eficiente que nada! Quem agora salva vidas, mas não exatamente por bons motivos, é o PCC. WIDER FILHO ACHINCALHA OS FATOS E A NOSSA INTELIGÊNCIA. POR QUE O CRIME ORGANIZADO NO RESTO DO PAÍS NÃO FAZ, ENTÃO, A MESMA COISA?

A guerra civil não-declarada mata uma média de 50 mil pessoas por ano – 26,31 pessoas por 100 mil habitantes (população estimada de 190 milhões). Se a média nacional fosse a de São Paulo, os mortos seriam 20.444 pessoas – 29.556 pessoas deixariam de morrer por ano.

Agora o Estadão
O Estadão preferiu ignorar a estupenda queda no número de homicídios e optou pelo seguinte título: “Cresce o nº de estupros no Estado”. Como se sabe, o combate a esse tipo de crime é mais matéria de educação e prevenção do que propriamente de ação policial, já que boa parte das ocorrências se dá no ambiente familiar ou doméstico – e, tragicamente, envolve crianças. A escolha editorial estava feita: quase todos os crimes caíram, mas escolheram para dar destaque um tipo em que houve aumento. Num segundo texto, quase sumido na página, reconhece-se: “A maior queda foi a de roubo de carros: 13,41%, seguido por lesão corporal com intenção, 12,5%. As tentativas de homicídio caíram 11,57% e lesão corporal sem intenção, 6,07%. Furtos de carros foram reduzidos em 7,52%, enquanto furto caiu 7,46%. Homicídio sem intenção caiu 10,05% e com intenção, 3,63%. Roubos a banco reduziram em 1,05% e roubo, 0,06%.”

E a queda de 66% no número de homicídios em nove anos? O jornal não noticiou.

Latrocínios
Agora notem outro destaque dado pelo Estadão: “Reportagem na quinta-feira mostrou, com exclusividade, que o latrocínio (roubo seguido de morte), crime hediondo, aumentou 64% na capital no ano passado, em relação a 2007. (...) Em 2008, foram registradas 69 ocorrências desse tipo de crime na capital, ante 42 no ano anterior. No total, foram 69 ocorrências - em 2007, foram 42. Em todo o Estado, o número foi de 267 no ano passado e 218 em 2007.” No ano passado, na cidade, houve, portanto, 0,62 morto por 100 mil habitantes vítima desse tipo de ocorrência e 0,65 no Estado. Se o Brasil fosse como o estado de São Paulo, dos 50 mil homicídios por ano, apenas 1.235 decorreriam de latrocínio – ou 2,47%.

E, acreditem, a petralhada invadiu o blog para dizer que a imprensa ESTAVA MAQUIANDO OS NÚMEROS DA VIOLÊNCIA EM FAVOR DE... SERRA!!!

A caminho da conclusão
Claro, eu poderia deixar de lado um texto como este, não é? Para que me expor à patrulha? Mas não deixo. Em qualquer país civilizado do mundo, entende-se a óbvia relação que há entre eficiência policial e queda nos índices de violência. Uma eficiência que também é produto de um estado institucionalmente organizado. Na Venezuela desordeira, do “querido (de Lula) Hugo Chávez”, os homicídios dobraram desde que o bandoleiro conquistou o poder: 48 por 100 mil habitantes - em Caracas, chegam a 130 – 12 vezes o índice do estado de São Paulo. Como se sabe, lá eles já vivem “o outro mundo possível” de que fala o Fórum Social Mundial, aquele que queima mato e dinheiro.

Sei que a muitos há de parecer exótico, mas policia eficiente e bandido na cadeia aumentam a segurança das pessoas, como direi?, “de bem”. A polícia de São Paulo dos últimos nove anos está de parabéns: meter em cana 145 mil pessoas que devem estar em cana é um verdadeiro poema humanista!
Por Reinaldo Azevedo

JIMMY CARTER, O CRETINO FILOTERRORISTA - Blog do Reinaldo Azevedo - 02/02/2009

Jimmy Carter, ex-presidente dos Estados Unidos (1977-1980), é um desses imbecis rematados que acabam adotados pelos “progressistas” porque se entende ser “um deles” – dos imperialistas -, convertido à causa “dos oprimidos”. Ontem o Estadão reproduziu uma entrevista do homem a Reza Aslan, do Global Viewpoint. O palerma que era presidente dos Estados Unidos quando se deu a revolução islâmica (1979) no Irã lidera o tal Carter Center - para promover a paz mundial e os direitos humanos, é claro...

Antes que entre no mérito das bobagens que disse sobre o Oriente Médio, cumpre recuperar um tanto da contribuição deste cidadão ao processo de paz. Como se diz acima, a Revolução Islâmica no Irã se deu sob a sua gestão. Mas não só isso. Terroristas disfarçados de “estudantes”, com o apoio dos aiatolás, mantiveram 52 reféns na embaixada americana em Teerã durante 444 dias. Foi o tempo que a gestão Carter levou para encontrar uma saída nas negociações com aqueles humanistas do turbante negro.

O ano de 1979 também foi marcado pela invasão do Afeganistão pela União Soviética. Indignado, Carter foi durão: boicotou os Jogos Olímpicos de Moscou, em 1980, ano em que começa a guerra entre o Irã e o Iraque.

Durante as duas guerras do Golfo (a de Bush pai e a de Bush filho), contra Saddam Hussein, os “progressistas” mundo afora não cansaram de lembrar que Saddam foi armado pelos EUA para tentar destruir o regime dos aiatolás. A guerra durou oito anos – estendeu-se ao longo dos dois governos de Ronald Reagan. Verdade. Mas Saddam começou a ser “usado” foi no governo do humanista Carter. Os EUA alimentaram com armas os radicais islâmicos do Afeganistão? Verdade. Mais uma política do governo... Carter. Um sábio.

Pois bem. Vamos agora à entrevista, cujo título é “Solução de dois Estados só depende de Israel''. A tese do ex-presidente está no livro "Podemos chegar à paz na Terra Santa: Um plano que vai funcionar". E por onde se começa a resolver o problema segundo esse iluminado plantador de amendoim? Israel tem de deixar imediatamente a Cisjordânia, parar com os assentamentos e eliminar o muro que separa a região do território israelense.

Huuummm... Grande idéia! Ninguém tem dúvida – a começar do Hamas e do Fatah – que, se Israel deixar a Cisjordânia agora, vai acontecer lá o que aconteceu em Gaza: uma guerra civil palestina, com a provável vitória dos terroristas. Aí, em vez de os foguetes caírem em áreas mais ou menos desabitadas de Israel, eles atinguirão o aeroporto de Telavive, bairros onde vivem milhares de pessoas, escolas... Quanto ao muro, Carter certamente sabe que os atentados suicida-homicidas foram praticamente eliminados. É feio? É. Outras alternativas foram tentadas. Também acho que os assentamentos têm de parar. Sigamos com trechos da entrevista, em vermelho. Comento em preto.

Parece que durante cerca de 40 anos o status quo beneficiou Israel. Mas agora parece que ocorreu uma virada, em termos demográficos. Não falta muito tempo para que haja mais árabes do que judeus entre o Mediterrâneo e o Rio Jordão. Esta não é a verdadeira ameaça à existência de Israel?
Exato. Logo haverá uma maioria árabe naquele território de um único Estado, o que significa que Israel terá apenas três opções completamente inaceitáveis. Uma delas é o que se pode chamar de limpeza étnica, coisa que ninguém deseja, e isto significa obrigar os palestinos a deixar o território. A segunda opção seria ter um país dentro do qual houvesse duas classes de cidadãos: uma delas seria composta pelos judeus, que teriam direito ao voto; a outra seria formada pelos árabes sem direito ao voto. E isso seria equivalente ao apartheid sul-africano.
A terceira e última opção é deixar que os árabes detenham a maioria dos votos, e com alguma divisão entre os judeus, e os árabes votando em bloco, eles controlariam todo o governo e não haveria mais um Estado judaico. Estas são as opções, excluída a solução de dois Estados.
A pergunta não trata de uma ameaça coisa nenhuma, mas do que entende ser uma fatalidade – e, nessa perspectiva, Israel já entraria numa negociação derrotado. Logo, o país estaria esperneando enquanto aguarda o fim trágico. Solidário, Carter vem lembrar três alternativas que não servem. A saída? Ora, os dois estados. Sim, bem poucos são os judeus e partidos israelenses que não concordam com isso. A pergunta é outra: quantos são os palestinos que aceitam o estado judeu?
Os israelenses saíram de Gaza, e o terror passou a dominar Gaza. Saíram do Sul do Líbano, e o terror passou a dominar o Sul do Líbano. Será que, temendo por uma das três alternativas ditas “inaceitáveis”, os israelenses devem entregar também a Cisjordânia aos terroristas? A lógica seria mais ou menos esta: "Ah, já que Carter diz que a gente não tem saída, então vamos nos render agora.

Parece que a opinião pública e a mídia americanas estão mais dispostas a criticar Israel após a guerra em Gaza.
As pesquisas mostram que isso é verdade. Acho que veremos grandes mudanças, e a demonstração mais concreta é a eleição de Barack Obama. Desde sua primeira semana na presidência, ficou claro que a paz no Oriente Médio será uma de suas prioridades. E o enviado especial escolhido por ele, George Mitchell, é muito mais qualificado do que muitos de seus predecessores.
Para qual governo americano a paz no Oriente Médio não foi uma prioridade? Ora, o próprio Carter patrocinou o acordo entre Egito e Israel, que resultou na devolução do Sinai. Qual foi a condição? Que os egípcios cessassem as hostilidades. E foi o que aconteceu. Desde aquele tempo, o acordo tem sido cumprido. E olhem que o líder israelense que celebrou o entendimento foi ninguém menos do que o durão Menachen Begin.
Mas esse nem o aspecto mais interessante da resposta de Carter. Notem que ele evoca Barack Obama justamente quando o entrevistador lembra que a opinião pública e a mídia americanas são hoje mais hostis a Israel do que já foram. Parece que o novo presidente é parte desse pacote. Mitchell??? É uma piada? Na sexta, o pacificador previu um recrudescimento da violência na região.

A maioria dos israelenses está disposta a abrir mão da Cisjordânia em troca da paz, e os palestinos desejam a mesma coisa. A poderosa voz do presidente dos EUA terá um imenso impacto sobre a opinião pública, não somente no seu país, mas também nos territórios palestinos e em Israel.
Eis o homem que demorou imodestos 444 dias para resolver a crise dos reféns na embaixada. A voz dos israelenses se faz ouvir em eleições democráticas. E é bem possível que a maioria da população defenda o fim da ocupação da Cisjordânia. Mas quem são “os palestinos” de Carter? Os do Hamas querem o fim de Israel. Faz parte de seu programa e de sua razão de ser. Um dia a “voz poderosa do presidente dos EUA” já foi a de Carter. Por que ele não celebrou o acordo com os palestinos? Por que outros não o fizeram depois dele? E Clinton? Por que não? A resposta é simples. Se eu fosse um nefelibata, poderia dizer que a vontade dos palestinos foi seqüestrada pelos terroristas. Mas tenho de ser objetivo, não? Os palestinos escolheram o terrorismo. Votaram no Hamas.

Qual seria a principal lição que o presidente deveria aprender a partir da sua experiência nas tentativas de encerrar o conflito no Oriente Médio?
Os EUA precisam desempenhar um papel forte desde os primeiros momentos de seu governo, sendo enfáticos nos esforços para conduzir as negociações até a sua conclusão. É necessário agir logo, demonstrar comprometimento profundo e ser persistente.
Claro, claro. E todo homem deve ser bom. E a gente não deve comer com os cotovelos sobre a mesa. E devemos ser generosos e audaciosos.

Este processo começa com o reconhecimento do papel desempenhado pelo Hamas nas negociações?
Ainda é cedo para isto. O Hamas se comprometeu a aceitar qualquer acordo negociado com Israel, desde que seja submetido ao povo palestino em um plebiscito, ou se for eleito um governo de unidade e os representantes do governo aprovarem o acordo. Este é um importante passo a ser dado quando chegar o momento nas negociações com o Hamas.
A fala seria coisa de vigarista se Carter não fosse apenas um tolo. As condições da “aceitação” do acordo impostas pelo Hamas dizem a razão pela qual é impossível negociar com o Hamas. Um plebiscito conduzido pelo terror resultaria na opção pela continuidade do terrorismo. A resposta ao governo de unidade nacional foi dada pelo Hamas quando expulsou o Fatah de Gaza, com a seqüência de tortura e execuções sumárias.

Talvez agora tenhamos a oportunidade de reconsiderar os últimos 30 anos de política externa americana em relação ao Irã. Que conselho daria a Obama a respeito do melhor modo de tentar uma aproximação com o Irã?
Ele já prometeu, antes e depois de ser eleito presidente, que abrirá todas as formas de comunicação com o Irã. Se você descartar o presidente Mahmud Ahmadinejad e se aproximar de membros mais responsáveis do governo do Irã, penso que, quando Obama enviar alguém para explorar as possibilidades de negociação, acho que essa pessoa será bem recebida. Meu conselho para Obama é simplesmente fazer o que prometeu que faria: abrir um canal de comunicações com o Irã.
Ora, fácil, não? Basta botar de lado o segundo homem mais poderoso do Irã, que trabalha em consonância com o núcleo duro do clero xiita... O resto se ajeita! Vamos lá, Obama, abra o canal.

O senhor é otimista com relação à situação no Irã e no Oriente Médio daqui a oito anos?
Sim, comparando com as circunstâncias atuais, de onde partimos. O melhor meio de restringir os movimentos potenciais do Irã para aumentar sua capacidade nuclear é conseguir a paz entre israelenses e palestinos, acabar com a guerra oficial entre Israel e Síria, Israel e Líbano.
Aqui, a mãe de todas as tolices: supor que a resolução dos conflitos entre os palestinos e os israelenses é central para contornar o terrorismo e a hostilidade dos países islâmicos contra Israel. A tese é simplesmente falsa. O Irã, por exemplo, que nem árabe é, está pouco se lixando para o assunto. A causa só lhe serve de um bom pretexto. Ou será que a revolução islâmica iraniana pensava nos palestinos? O jihadismo à moda Bin Laden luta contra o risco de ocidentalização do Islã – Israel é só um símbolo do que seria a conspurcação de uma terra sagrada. Se o país fosse varrido do mapa amanhã, uma nova causa de alevantaria.

Acho que isso eliminaria, e muito, a ameaça da qual os iranianos sentem que precisam se defender.
Ah, entendi. O Irã quer a bomba, gente, é para se defender! Vai ver teme ser invadido por Israel. Carter é um idiota, mas um idiota perigoso.

E de uma maneira mais geral, debilitaria a influência de Teerã e seu prestígio, que cresceu por causa da guerra do Iraque. Assim, o fim da guerra no Iraque e a paz no Oriente Médio seriam duas coisas que colocariam o Irã de volta a uma posição em que sua influência negativa em prol do terrorismo diminuiria, e o país sentiria menos necessidade de ter armas nucleares para se defender.
Certo. O corolário é o seguinte: Israel deve ir para o sacrifício, oferecendo-se em holocausto. Sai de Gaza agora, destrói o muro, expõe-se ao foguetório e aos homens-bomba do Hamas e de outros radicais. E, assim, contribui para diminuir a influência do Irã!!!
É, é um modo de ver o mundo...
Carter não deixa der uma personagem um tanto assustadora. Ele é a encarnação, no Ocidente, da lógica e dos motivos do terrorismo. No poder, foi um tolo desastrado. Fora dele, confere altitudes de fina estratégia a tolices. Ele tem pouca ou nenhuma influência. Mas o que diz é eco de teses influentes na Casa Branca e mundo afora.

O terrorismo conseguiu o que jamais imaginou que conseguisse: ser ouvido como voz legítima. E o establishment ainda bate no peito e faz um mea-culpa, a exemplo da entrevista que Barack Obama deu a uma TV árabe.

Segurem-se! O piloto aderiu!
Por Reinaldo Azevedo

Os esqueletos do governo Lula - Carlos Alberto Sardemberg - O Estado de São Paulo - 02/02/09

Carlos Alberto Sardenberg*

Lendo o relatório do Tesouro sobre as contas do governo federal em 2008, divulgado na semana passada, fica-se com a impressão de que a administração acelerou de maneira notável os investimentos. Diz lá que as despesas de custeio tiveram aumento de 7,2% sobre 2007, enquanto o dispêndio com capital subiu nada menos que 27,9%. Bom, não é mesmo?

Mas olhe para outros números: as despesas totais com custeio, em 2008, alcançaram R$ 136 bilhões, isso incluindo alguns programas sociais, como o pagamento de seguro-desemprego e de auxílio aos idosos. Sem isso, o custeio - funcionamento da máquina - ficou em R$ 92,7 bilhões.

E os investimentos? Apenas R$ 28,2 bilhões. Isso foi o equivalente a 1% do produto interno bruto (PIB). Comparando com 2007, o grande esforço do governo em turbinar os investimentos, com PAC e tudo, resultou num aumento de 0,2% do PIB. Já as despesas de custeio equivaleram a 4,68% do PIB - o que mostra um quadro bem diferente.

E para completar: em 2008, o governo federal gastou com Previdência o total de R$ 199,5 bilhões (6,9% do PIB) e com pessoal, R$ 130,8 bilhões (4,5%).

Eis por que o governo não pode fazer neste momento a chamada política contracíclica, ou seja, disparar investimentos em obras, para aumentar a demanda e assim combater a desaceleração da economia. Não pode porque fez a política pró-cíclica durante a bonança: aumentou as despesas quando a arrecadação subiu espetacularmente em consequência do aquecimento econômico. E, como mostram os números, os gastos continuam concentrados em tudo o que não é investimento.

Acrescente-se que o governo pretendia gastar em investimentos o dobro do que efetivamente aplicou. Como em anos anteriores, não conseguiu.

Não é fácil tocar uma obra. Projeto, licenciamentos, licitações, instalação de canteiros, tudo isso requer competência, sobretudo com a kafkiana legislação brasileira.

Quer ver um resultado? Na sexta-feira, o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, prometia apertar as empreiteiras envolvidas nas obras da transposição do Rio São Francisco. Disse que não toleraria mais atrasos e tal. Reagia à desistência de algumas construtoras. E olha que essa obra era "a realização" do governo Lula.

Além disso, não basta investir. É preciso ter bons projetos que movimentem a economia enquanto são implementados e, quando prontos, representem ganhos de produtividade. Por exemplo, uma ferrovia que diminua o tempo e os custos de levar soja ao porto.

Na década de 1990, o governo japonês gastou rios de dinheiro em obras, também no esforço para tirar o país da recessão. Deu em nada. Com a influência dos políticos na escolha dos projetos, tudo resultou em pontes que iam do nada para nenhum lugar.

Nos EUA, a equipe econômica de Barack Obama, que se prepara para gastar uns 5% do PIB em obras, comentava outro dia que o maior problema estava sendo encontrar bons projetos.

E os bancos públicos? - O governo Lula está empenhado também em outra frente para estimular a economia. Pressionou os bancos públicos para que reduzam os juros e emprestem mais a pessoas e empresas, de modo a combater a crise do crédito.

A propósito, convém lembrar desta história: em meados de 1999, o governo Bill Clinton pressionou as agências hipotecárias Fannie Mae e Freddie Mac para que flexibilizassem as regras de concessão de empréstimos e reduzissem juros. O objetivo: estender os financiamentos da casa própria às famílias de baixa renda, então classificadas no grupo subprime.

Eis como começou a crise do setor imobiliário, que só iria aparecer em 2007, de sua vez dando origem à derrocada de todo o sistema financeiro.

As famílias mais pobres, majoritariamente formadas por negros e hispânicos, só conseguiam financiamento se pagassem taxas de juros de 3 a 4 pontos porcentuais acima das cobradas em negócios convencionais. Negócio muito arriscado, era evitado por todas as partes. Assim, essas famílias ficavam de fora do boom imobiliário dos anos 90.

Por isso o governo Clinton apertou as duas grandes agências hipotecárias, para ampliar a oferta de financiamentos aos mais pobres.

Podia fazer isso? Podia, as agências eram semiestatais - privadas, mas com seus títulos tendo garantia do governo.

As agências cumpriram o programa, cujo objetivo era fazer com que metade de seu portfolio fosse formado pelos financiamentos a famílias de média e baixa rendas. Funcionou. Milhões de casas de até US$ 250 mil foram financiadas. O programa foi considerado um êxito notável. Até que, a partir de 2007, as duas agências simplesmente quebraram, com uma carteira lotada de hipotecas podres. Eis o caso: o enorme desastre de um sistema financeiro desregulado - que empacotou, securitizou, financiou e refinanciou as hipotecas subprime - teve origem remota numa decisão política do governo. Bem-intencionada, claro, mas obviamente mal implementada.

Atenção, portanto, ao governo Lula, que está preparando um amplo programa para financiar 1 milhão de casas para famílias com renda mensal de até cinco salários mínimos.

Os especialistas mostram que as famílias de baixa renda não têm condições de pagar, de modo que precisam de subsídios. Se o governo der o subsídio diretamente ao mutuário, pode ser. Mas se resolver, por exemplo, mandar a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Banco do Brasil (BB) concederem empréstimos com critérios mais frouxos, já sabemos aonde vai dar.

O governo já está pressionando os seus bancos para que concedam mais empréstimos, o que pode levá-los a tomar risco elevado, futuros esqueletos. Já aconteceu. No governo FHC, BB e CEF receberam bilhões de reais para não quebrarem.

Políticos adoram fazer isso. Concedem o empréstimos hoje e o banco quebra lá na frente, no outro governo.

*Carlos Alberto Sardenberg é jornalista
Site: www.sardenberg.com.br

Sunday, February 01, 2009

Chávez completa 10 anos no poder buscando reeleição ilimitada - O Estado de São Paulo - 01/02/09

Populismo, má gestão econômica e centralismo político expõem obsessão de presidente em perpetuar-se no cargo

Renata Miranda

Em 2 de fevereiro de 1999, impulsionado pelo desejo popular de mudança, Hugo Chávez Frías chegava à presidência da Venezuela com 56% dos votos. Amparado em uma plataforma que prometia refundar o país respeitando os trâmites democráticos e beneficiado pelo boom do preço do petróleo, Chávez aumentou seu poder por meio de sucessivos plebiscitos e ganhou popularidade ao investir em programas sociais, a maioria claramente assistencialista.

Dez anos depois, Chávez busca desesperadamente maneiras de continuar reinando absoluto no Palácio de Miraflores - o que reforça a tese de que jamais haverá chavismo sem Chávez. Sua próxima cartada é o referendo do dia 15, no qual os venezuelanos irão decidir se ele pode se candidatar a reeleições ilimitadas. Se perder, Chávez garante que deixa o poder e a política em 2013, quando termina o atual mandato. Se ganhar, jura que se aposenta em 2021. Pouca gente acredita nas promessas. A luta para continuar no topo, porém, não será fácil.

"Os melhores anos de Chávez ficaram para trás - tanto na economia quanto nas questões sociais e políticas", afirmou ao Estado, por telefone, o cientista político Sadio Garavini di Turno, da Universidade Central da Venezuela.

A Venezuela de hoje é bem diferente do país que Chávez recebeu há uma década. O preço do barril do petróleo, principal produto de exportação venezuelano, chegou a aumentar dez vezes no período. Mesmo assim, o governo não investiu em infraestrutura, sufocou a iniciativa privada, inchou a máquina estatal (o número de funcionários públicos dobrou sob o chavismo) e, para tentar ganhar projeção internacional, Chávez torrou bilhões de petrodólares em ajuda a países como Cuba, Bolívia e Nicarágua. O resultado: faltam bens básicos nas prateleiras dos supermercados, a inflação anual beira os 30% e a indústria nacional vive sob o temor da nacionalização e da perseguição fiscal.

"Apesar de as cifras oficiais registrarem a redução da pobreza e da desigualdade social, a má gestão administrativa e o centralismo político de hoje lembram a acumulação de tensões que precedeu a deterioração econômica na década de 80", afirmou o economista Ronald Balza, da Universidade Católica Andrés Bello.

Para o também economista José Toro Hardy, ex-diretor da estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA), Chávez errou ao não diversificar a economia. "Ao centralizar tudo no petróleo, o governo reduziu os investimentos em outros setores, prejudicando a produção interna", disse. "Em dez anos, perdemos quase metade das indústrias do país."

Outro engano, aponta o economista, foi o aparelhamento da PDVSA após uma greve, em 2002. "Chávez substituiu os funcionários especializados por aliados políticos", afirmou Toro Hardy. Em outra canetada presidencial, o governo assumiu o caixa da PDVSA - e a estatal do petróleo passou a bancar de cestas básicas a financiamento da casa própria. Segundo Toro Hardy, a PDVSA poderia estar produzindo cerca de 5 milhões de barris de petróleo por dia, mas hoje a produção não passa de 2 milhões de barris diários.

Para Balza, o auge do chavismo ocorreu em 2003. "Foi quando os preços do barril de petróleo dispararam e Chávez começou a consolidar seu poder político por meio da adoção de programas sociais direcionados aos pobres", disse. Entre os projetos implementados estão a criação das missões educacionais e de saúde, tocadas com ajuda de técnicos cubanos. Além disso, o governo tem programas de complementação de renda e financiamento de obras para grupos comunitários.

Nos anos seguintes, Chávez aproveitou-se da divisão da oposição - que boicotou as eleições parlamentares de 2005 - para dar o golpe final. Uma lei aprovada na Assembleia Nacional sob seu controle ampliou o número de juízes da Suprema Corte. Assim, em pouco tempo, Chávez passou a controlar, além do Legislativo, o Judiciário.

Apesar da concentração de poder, o país continua longe de ser o paraíso que a chamada "revolução bolivariana" de Chávez apregoa. Um exemplo é a corrupção. De acordo com o ranking elaborado anualmente pela ONG Transparência Internacional, a Venezuela está entre os 15 países mais corruptos do mundo - na América Latina, só perde para o Haiti.

A segurança pública é outro pesadelo. Dados oficiais mostram que o número de assassinatos no país dobrou na era Chávez, atingindo uma média de 48 homicídios para cada 100 mil habitantes. Em Caracas, a violência é ainda maior: são 130 homicídios por 100 mil habitantes - no Rio de Janeiro, para efeito de comparação, a taxa é de 37 homicídios por 100 mil habitantes.

Depois de perder o referendo constitucional de 2007 - sua primeira derrota eleitoral desde 1998 -, Chávez radicalizou seu discurso. A queda abrupta do preço do petróleo, no ano passado, apressou seus planos de incluir na Constituição uma emenda que permita reeleições ilimitadas para que possa concorrer novamente em 2012. A proposta estava no projeto de reforma que foi rejeitado por 50,7% dos venezuelanos em dezembro de 2007.

"Chávez fala do ?socialismo do século 21?, mas a Venezuela vive sob o caudilhismo do século 19", resume Garavini di Turno. Uma pesquisa divulgada na quarta-feira pelo instituto Datanalisis mostrou que Chávez teria uma vitória apertada no referendo do dia 15 - o "sim" tem 51,5% das intenções de voto, enquanto o "não" tem 48,1%.

Perdidos na crise - FHC - O Estado de São Paulo - 01/02/09

Fernando Henrique Cardoso

A crise financeira estourou nos Estados Unidos em agosto de 2007. Subitamente o mundo tomou conhecimento de que havia um problema: hipotecas sobre a compra de imóveis dadas com garantias precárias. De início os bancos americanos diziam não ter nada com o assunto. Logo depois foram obrigados a reconhecer que os "veículos especiais" que eles criaram eram, sim, de sua responsabilidade. Reconheceram para o banco central americano, o Federal Reserve (Fed), poder dar-lhes dinheiro para cobrir os buracos, posto que os financiadores de hipotecas, não sendo bancos, não teriam acesso ao socorro federal. O susto não serviu de lição. De degrau abaixo a degrau abaixo, desfez-se o castelo de cartas. Hoje todo mundo reconhece que o sistema financeiro estava muito "alavancado", quer dizer, emprestava com uma base de capital próprio muito pequena, com o dinheiro dos outros. Os depositantes, quando descobriram a ligação dos bancos com as hipotecas, correram para retirar depósitos de bancos com poucos fundos próprios. De novo veio o socorro do Fed, desta vez trilionário. O mundo, que ainda não se acostumara ao "bilhão de dólares", teve de ver "trilhão" no horizonte, mas de dívidas...

Daí em diante, houve mil "soluções criativas" para sair da crise. A "laborista", do primeiro-ministro Gordon Brown, saudada por todos, foi a de dar dinheiro aos bancos, comprando ações, em vez de, como fez o Fed, absorver títulos podres e conceder empréstimos a juros baixos e com prazo de devolução infinito. Tesouro e bancos ingleses ficaram associados e não se sabe até que ponto estes foram "nacionalizados". O governo americano continuou "inovando": deu créditos com dinheiro do contribuinte, não só aos bancos, mas às empresas, e considera a possibilidade de dar recursos diretamente aos cidadãos pendurados em hipotecas impagáveis. O próprio Fed concedeu empréstimos a outros bancos centrais e, mais espantoso ainda, absorveu títulos "tóxicos" de empresas não-financeiras. Os demais países europeus garantiram depósitos, enquanto os do mundo em desenvolvimento se puseram às pressas a distribuir dinheiro público aos magotes para resolver problemas financeiros ou para ajudar empresas que se enrolaram na crise especulando com o valor das moedas.

Enfim, a velha e boa "socialização das perdas". Essa foi a breve história financeira do ano 2008.

O pior é que, com catadupas de dinheiro público, a crise não cede. Ela deixou de ser "financeira" para ser "econômica": as empresas não investem, os bancos não emprestam e, quando o fazem, é com muito cuidado. Os empresários olham em volta e têm medo de expandir seus negócios: mais do que crédito, faltam compradores solventes. Os mercados estão encolhendo e encolherão ainda mais porque, com ou sem socialização das perdas, houve perda substancial de riqueza ou, como Marx diria, está havendo queima de mais-valia. A riqueza financeira virou pó, porque ela é pó quando falta a confiança. Pulvis est et in pulverem revertitur, como acontece com o corpo quando a alma some dele. Nestas situações "o mercado", isto é, os empresários e investidores, só acredita no governo. Mais grave ainda, os governos acreditam que podem resolver a crise. Como? Dando dinheiro ao mercado e investindo. Só que para fazê-lo se endividam e não resolvem de imediato as aflições de todos porque o medo pauta o consumo e a economia contemporânea fez o casamento entre mercados voláteis e consumidores ávidos, movidos a propaganda. Sem consumidores não há salvação e o principal consumidor para a saída da crise não são as pessoas, mas as empresas. Isto é, o investimento.

Como convém dispor de uma autoridade intelectual insuspeita justificando abrir o cofre, o pobre lorde Keynes é usado como se fosse o pai da socialização das perdas e da gastança pública indiscriminada. E como também é sempre bom ter um culpado, a "globalização" é indigitada como responsável pelo que é inerente ao capitalismo, a especulação, e pela falta de controle numa economia, a principal, a americana, por cujos desmandos, aí, sim, pagaremos todos. Como o diagnóstico é precário, as barreiras protecionistas somadas à gastança pública seriam o antídoto aos malefícios da "globalização". E com isso, em vez de se resolver a crise (a solução virá com dor e lágrimas, sobretudo dos desempregados, vítimas inocentes dos desmandos, pela continuada queima de mais-valia até que, atingido o fundo do poço, a "alma" dos capitalistas tenha novo sopro de vida), espicha-se o sofrimento e se sonha com um mundo não-globalizado, como se isso fosse possível com o desenvolvimento tecnológico e a inter-relação comunicativa existente.

Isso não quer dizer que não haja nada a fazer, que basta esperar que o próprio mercado purgue seus pecados. Os governos precisam, sim, atuar. Mas olhando para o futuro, ajudando o investimento produtivo, seja ele público ou privado. E não endividando o povo (que pouco sabe que pagará as custas...) para salvar quem é insalvável. Sem esquecer que a poupança pública (em nosso caso ela é negativa) é insuficiente para dinamizar um sistema que é capitalista e que a ajuda à custa de endividamento futuro resultará em mais aperto ou em inflação. Em qualquer caso haverá redução das chances de uma retomada saudável do crescimento econômico.

Por fim é bom dizer que a redução da riqueza global oferece a todos, inclusive e principalmente aos governos, a chance de repensar o futuro. Ou se aumentam as regulações financeiras globalmente (sem sufocar a capacidade de inovação, mãe do desenvolvimento) e se repensa o modelo cultural de consumismo desenfreado e de dilapidação da natureza, ou a retomada de amanhã pode ser ainda mais danosa do que foi a etapa que se está esgotando.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República