Tuesday, December 09, 2008

Conheça os argumentos da ação em julgamento pelo Plenário do STF sobre Raposa Serra do Sol - Blog do Reinaldo Azevedo - 09/12/2008

Do site do STF:

Entre dezenas de ações que envolvem a Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, localizada no estado de Roraima, que tramitam no Supremo Tribunal Federal, a primeira sobre a demarcação da área a ficar pronta para julgamento é a Petição (PET) 3388, ajuizada em abril de 2005 e analisada nesta quarta-feira (27) pelo Plenário do STF.

A ação foi proposta pelo senador Augusto Botelho (PT-RR) contra a Portaria 534, editada em 2005 pelo Ministério da Justiça, que demarca a reserva indígena em área contínua, e contra o decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que homologou a demarcação, em 15 de abril do mesmo ano.

Na ação, o senador afirma que todo o processo administrativo que resultou na edição da portaria e na homologação da demarcação foi viciado, “divorciado da norma regente do procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas”.

Segundo o senador, a demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol em área contínua põe em contraposição, de um lado, o princípio constitucional da tutela dos índios e, de outro lado, os princípios constitucionais da legalidade, da segurança jurídica, do devido processo legal, da livre iniciativa, da proporcionalidade e o princípio federativo.

Para Botelho, a STF deve sopesar todos esses princípios constitucionais e considerar a demarcação descontínua da reserva para evitar que “centenas ou milhares de trabalhadores que hoje cultivam terras na área se desloquem para a periferia da capital do estado de Roraima”. Ele afirma que essa “seria uma forma de equacionar a questão de forma a permitir que nenhum princípio federativo envolvido seja vilipendiado em prol de outro”.

Vícios de origem
Na ação, o senador relaciona as inúmeras ilegalidades que teriam viciado o procedimento administrativo que levou à demarcação da reserva em área contínua. Ele cita relatório produzido por uma comissão de peritos convocada pela 1ª Vara da Justiça Federal de Roraima especialmente para avaliar o processo administrativo da demarcação.

Esse documento, denominado “Relatório da Comissão de Peritos”, teria chegado à conclusão de que o processo que culminou na demarcação foi “eivado de erros e vícios insanáveis” porque:

- ouviu apenas os indígenas favoráveis à demarcação em área contínua, todos indicados pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI);
- teve a participação do governo do Estado comprometida, inclusive por omissão e descaso do próprio governo;
- não convidou acadêmicos para participar do processo;
- dos grupos religiosos, incluiu somente a Igreja Católica no grupo técnico que analisou a demarcação, sem explicitar a razão;
- não ouviu alguns municípios com terras na área da reserva (Normandia);
- não considerou os produtores agropecuários, os comerciantes estabelecidos na região, os garimpeiros, os arrozeiros e outros atores que vivem no local;
- o relatório antropológico sobre a demarcação é uma coletânea de peças que não forma um corpo lógico e não considera os reflexos da demarcação em área contínua para a segurança e defesa nacionais e para a economia do estado de Roraima;
- o laudo antropológico da Funai (Fundação Nacional do Índio) é uma reprodução de laudo que já havia sido apresentado para justificar outro tipo de demarcação das terras da Raposa Serro do Sol.

A essas irregularidades, o senador soma outras, a seguir:

- o laudo antropológico da Funai é assinado por uma única pessoa, a antropóloga Maria Guiomar de Melo, o que demonstraria a parcialidade e a conseqüente nulidade do documento, diante da “absoluta desobediência aos critérios que devem reger o procedimento administrativo de demarcação”;
- pessoas nomeadas para compor grupo interdisciplinar responsável pela produção do laudo sequer sabiam que compunham o grupo e “ficaram ainda mais espantadas quando souberam que foram nomeadas em virtude de formação especializada que nunca possuíram”;
- o laudo é “a origem e a justificação” de todas as decisões do governo federal para a demarcação da reserva em área contínua;
- a demarcação em área contínua vai gerar “irremediáveis prejuízos à segurança e à defesa nacionais” e “aos próprios índios, com ocorrência de êxodo rural” e “exacerbação dos conflitos” porque a demarcação abrange índios de diferentes etnias;
- os índios que habitam a área estão totalmente integrados à sociedade e serão prejudicados, uma vez que o decreto que demarca a reserva proíbe “o trânsito e a permanência de pessoas ou grupos não-índios” na região;
- a demarcação, como quer o governo, “subverte toda uma ordem que há décadas se vem cristalizando” e também obriga “não-índios que habitam a região há três ou mais gerações” a abandonar suas terras;
- a demarcação rompe com o equilíbrio federativo, uma vez que o estado de Roraima possui mais da metade de seu território como bem da União. Ou seja, grandes extensões territoriais, que poderiam ser alvo de políticas públicas do governo estadual, são afetadas por outro ente federativo, a União;
- o senador diz que, segundo as Forças Armadas, a demarcação da reserva, com áreas ricas em minerais e de difícil controle, ocupadas por minorias pouco expressivas da população brasileira, pode levar a pressões internacionais insuportáveis e a uma impossibilidade de fiscalização da área. As Forças Armadas lembram, ainda, a pretensão da Venezuela de estender sua fronteira até o rio Essequibo, localizado em território fronteiriço ao da reserva (próximo à Guiana), e a intenção da ONU (Organização das Nações Unidas) de restringir a atuação militar em território indígena;

Por fim, o senador Augusto Botelho afirma que uma comissão criada pelo Senado elaborou relatório propondo a demarcação descontínua da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, com a exclusão:
- das áreas necessárias à exploração econômica;
- das sedes do município de Uiramutã e das vilas de Àgua Fria, Socó, Vila Pereira e Mutum;
- das estradas estaduais e federais da área, com o livre trânsito nessas vias;
- da área do Parque Nacional Monte Roraima;
- das áreas tituladas pelo Incra e dos imóveis com propriedade ou posse anterior a 1934;
- de faixa de 15 quilômetros ao longo da fronteira do Brasil com a Guiana e a Venezuela.
Por Reinaldo Azevedo

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