Wednesday, July 25, 2007

UTOPÉIA - Do blog Prosa & Política de 25/07/07

Por Ralph J. Hofmann


O ano de 2003 trouxe ao povo Brasileiro um momento de catarse. Era um dos poucos lugares no mundo que haviam logrado eleger um trabalhador braçal, com o mínimo de educação técnica possível ao mais alto cargo da nação. Eleição democrática. A voz do povo falara. Um homem que sentira as agruras da vida nos níveis mais baixos da sociedade iria zelar para que as oligarquias entrincheiradas fossem alijadas dos pontos chave da sociedade.
Carregava consigo o beneplácito dos estudantes universitários e seus professores, de certas vozes distintas no mundo acadêmico e até de muitos empresários que o avaliavam pelas suas boas intenções.
Daria oportunidade aos dissidentes que haviam amargado anos de exílio, seja por estarem fora do país seja por estarem afastados dos centros de decisão pelas suas crenças políticas.
E antes de tudo, no decorrer de sua longa caminhada ao poder este homem nunca havia lançado mão da violência, e mais, havia nos últimos meses concordado que não cabia desmantelar o que já existia em termos de atividade privada e de medidas públicas bem sucedidas no país, o que, em última instância era o que gerava riquezas que alimentavam o povo.

Havia os céticos. Como um país complexo como o Brasil poderia ser gerido por um homem avesso a leituras, mesmo que de relatórios técnicos, por um homem que essencialmente era uma pessoa carismática com um instinto para dizer a cada platéia o que esta queria ouvir. Como poderia um primeiro mandatário dar ordens sobre situações complexas oriundas de diferentes áreas simultaneamente.
Mas enfim, o presidente de seja o que for sempre é essencialmente o líder de uma equipe. Escuta seus comandados e decide entre opções. Assim o país jamais ficaria paralisado. O importante seria que este operário estaria, segundo se preconizava, munido de noções de ética e moralidade advindas dos sofrimentos que passara em seus primeiros anos.
O país ouviu durante meses pessoas que conheciam a estrutura do seu partido declararem taxativamente que quem comandava a equipe montada era o próprio presidente. Este estaria se ocupando da imagem do país, mas que ninguém faria nada nos seus ministérios sem que o próprio mandatário desse sua aprovação.
Era importante frisar isto, pois aos observadores parecia que a Casa Civil, O Ministério da Fazenda e sua Secretaria Especial para Assuntos Internacionais estariam governando o país. Mas não, diziam os entendidos ou os alegadamente íntimos, “o Presidente manda em tudo”.
Sendo isto verdade podemos imaginar as lideranças do governo sentadas em suas salas de reunião recendentes a “puros” cubanos, rum e Romanée Conti, mapeando a transformação numa legítima utopia socialista. Imaginamos os mesmos planejadores preenchendo um quebra-cabeças com gráficos, quadros, cronogramas e organogramas, montando uma estrutura equilibrada moldada aos seus princípios éticos morais e de justiça social.
Mas em pouco tempo constatamos, por vídeos, evidências escritas, extratos de contas bancárias, sinais de enriquecimento rápido que o papo era outro.
As reuniões eram para determinar como efetuar o saque do botim. Eram as reuniões dos “capi mafiosi”. Administrar? Nem em sonho. A equipe tinha membros competentes. Mas não em obter soluções para o crescimento do país. Este ficou por conta do que havia sido feito antes da eleição que guindara o presidente ao palácio. Ficou por conta de esforços do setor privado ao longo dos quinze anos anteriores. Ficava-se no “status quo”, com um empurrãozinho daqui, uma apertadinha ali e uma pressão acolá.
Internacionalmente era uma questão de mostrar-se socialista. Não importa que fosse no contexto de um socialismo alijado por cinqüenta anos de insucesso na Europa Ocidental e oitenta anos de insucesso na Europa Oriental. Era uma questão de ser solidário com congêneres das Américas. Mesmo que isso significasse praticamente doar riquezas aos vizinhos ou seguir sambando enquanto um vizinho se empanturrasse de armas qual uma Alemanha da década de trinta.
Quando um país vizinho está fortemente armado normalmente chega um dia em que quer usar suas armas. Vide Saddam Hussein e o Kuwait. Ainda mais quando esgota suas fontes de riqueza sem aproveita-las para garantir o futuro de seu país. Mas o Presidente nos assegura que a amizade com o vizinho será imorredoura. E o Ministro Especial garante isto também. Assim também o antigo Chefe da Casa Civil. Podemos dormir descansados. Nossos filhos e netos não terão de se defender contra o vizinho. Não terão de pagar ano após ano para armar este país para que esteja a salvo do inimigo.
Também cabia ser solidário com as massas mobilizadas contra a modernidade no campo. Não interessa se pregam um desprezo total contra as leis, se efetivamente transgridem a lei com violência, se infringem direitos de outros.
A acomodação de amigos e simpatizantes significa que as próprias fontes e origens de regulamentos e normas estavam sendo solapadas. Organismos criados em décadas de trabalho, com informações seguras quanto às necessidades e objetivos a alcançar no país passaram a ser desmanchadas para acomodar a estrutura de serventes amigos do poder. Planos criados para defender e desenvolver o país foram passados às mãos de administradores que entre pusilânimes e ignorantes deixaram que fossem desmontados, sem que algo de novo surgisse no seu lugar. Passamos a ter ministros que seguindo o próprio exemplo da presidência, não sabem o que precisam fazer. Não conseguem argumentar as necessidades de seus ministérios, pois sequer as conhecem. Não escutam os poucos peritos que sobraram. Assim temos crises como a da aftosa, temos uma transposição de Rio São Francisco apenas baseada em fatores emocionais, temos Pedro roubando de Paulo, temos um apagão aéreo e uma previsão de apagão de energia.
Isso para não falar da corrupção progressiva de todos os aspectos da vida pública nacional.
Realmente, há um monstro de cem pernas devorando tudo que é sólido neste país. O objetivo dos confidentes do Sr. Presidente não é a Utopia. É um mundo em que tenham o poder. Querem algo como o “ Tausend Jahr Reich” (Império de Mil Anos) do Hitler. Um país que lhes pertença para fazerem suas experiências. Mesmo que, como ocorreu na Rússia, na China e no Camboja isto custe a vida de dezenas de milhões. Não Utopia, Utopéia.
Pena que o Presidente operário não tenha dado certo. Teríamos tido prazer em aplaudi-lo se estivéssemos errados em 2003 ao nos mostrar céticos. O problema agora é outro. Com o egoísmo das oposições que não conseguem ser oposição, que lutam por migalhas, vamos ter de seguir agüentando essa perda de estatura do país após 2010?
UTOPÉIA

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